A falta de ações do poder público para combater a transmissão de doenças nas propriedades rurais preocupa. Há três semanas, oito bovinos tiveram de ser sacrificados em Picada Stumpf, no interior de Santa Clara do Sul, por estarem contaminados com a tuberculose.
O veterinário Otomar José Ferronatto diagnosticou o problema no dia 25 de setembro. A suspeita surgiu quando a família de Paulo Kollet, 35, abateu um novilho para consumo próprio e percebeu que havia manchas pretas no pulmão e fígado. A partir daí, os demais animais foram examinados.
A doença foi constatada em 12 dos 18 bovinos da propriedade, mas ao serem sacrificados, o frigorífico avaliou que quatro não estavam contaminados e ressarciu o valor da carne. Seis animais eram vacas leiteiras, dois bois de canga e quatro novilhos. Todos foram encaminhados a um abatedouro sanitário. A família calcula um prejuízo de R$ 25 mil.
Como o município não está cadastrado no projeto regional, a família necessita encaminhar os documentos requisitando indenização ao Fundo Estadual de Sanidade Animal (Fundesa).
O principal sustento da família provinha da produção leiteira. Por dia eram vendidos 90 litros ao preço de R$ 0,61 cada. A família possui R$ 4,5 mil em dívidas, provenientes da compra de um resfriador de leite. Ela acredita que a contaminação se deu ao comprar um animal sem registro de sanidade de outro produtor do município.
Os produtores dependem da indenização para reestruturar a propriedade. Daqui a seis meses, quando a doença estiver controlada, a família pretende comprar novos animais para diminuir as perdas no campo.
Conforme dados da Secretaria da Agricultura do município, este foi o segundo caso em um ano. Em março de 2011, Semário Christmann, de Chapadão, teve que abater 14 bovinos.
Município alega falta de interesse dos produtores
O secretário da Agricultura de Santa Clara do Sul, Eduardo Weiss ressalta que a falta de obrigatoriedade nos testes dificulta o trabalho do município. “Se o projeto fosse exigido, certamente aplicaríamos as medidas cabíveis, pois estamos dispostos a ajudar.”
Weiss aponta que os bancos exigem um exame antes de fornecer financiamentos para a compra de animais, o que auxilia na prevenção. Aconselha aos produtores que comprem apenas bovinos certificados e que façam os testes por conta própria. “A maioria não faz pelo valor da taxa, que é chega a R$ 15, mas deveriam pensar nas consequências.”
Contaminação em humanos
Segundo o médico veterinário Otomar José Ferronatto, os seres humanos podem contrair a doença. A transmissão para pessoas ocorre por meio da ingestão de alimentos não pasteurizados – como leite, linguiça e carne mal passada – ou pela respiração. Dos casos de tuberculose humana, em média 13% são decorrentes da transmissão por animais.
A tuberculose é uma doença crônica e se desenvolve lentamente nos animais. O maior causador da transmissão é a compra irregular de animais entre os produtores, visto que não se sabe ao certo como está a saúde do animal.
A contaminação entre os animais ocorre por diversos fatores, como respiração, alimentação no mesmo cocho (pela saliva) e ingestão de leite. Aponta que a transmissão da tuberculose é mais rápida nas pequenas propriedades, onde os animais ficam aglomerados em áreas menores.
Municípios devem se inscrever em projeto
Conforme o coordenador do Programa de Erradicação de Tuberculose e Brucelose, Oreno Ardêmio Heineck, o principal agravante para as contaminações é a falta de interesse do poder público. “Muitos políticos se promovem sobre os projetos, mas não os aplicam nos municípios. Quem paga a dívida são os produtores.”
Ressalta que apenas as cidades que integram a comarca – Arroio do Meio, Capitão, Coqueiro Baixo, Nova Bréscia, Pouso Novo e Travesseiro – estão efetivamente incluídos no projeto. Observa que Marques de Souza, Lajeado, Encantado, Roca Sales, Colinas e Westfália encaminharam uma carta ao estado pedindo a inclusão.
Heineck enfatiza a gravidade do controle. Observa que é uma questão de saúde pública, que denigre a imagem da região. Cita que em pouco tempo as empresas comprarão apenas leite de propriedades com selo de sanidade.
Falta estrutura do governo
Muitos produtores reclamam da demora em receber os certificados de propriedade livre e a indenização de animais abatidos. Conforme o inspetor sanitário de Arroio do Meio, Luis Cesar Garcia Cougo, os problemas são resultado da falta de estrutura do Ministério da Agricultura (Mapa). Cita que isso tira a credibilidade do projeto.
Cougo observa que alguns veterinários contratados pelo governo para diagnosticar os rebanhos demoram a finalizar exames, causando atraso na liberação dos certificados. “O município não pode cobrá-los, pois foram contratados pela União.”
No início do programa eram 15 veterinários, mas apenas nove continuam nas seis cidades da comarca.
Desde 2009, foram abatidos 543 animais nos seis municípios da comarca. Houve 473 casos de bovinos contaminados com tuberculose, encontrados em 139 propriedades. Outros 70 foram diagnosticados com brucelose em 30 domínios rurais. Todos os animais foram sacrificados pela Inspetoria Sanitária.
Saiba mais
Prevenção
• Realizar exames preventivos periódicos; solicitar testes antes de inserir animais na propriedade; abater animais contaminados em no máximo 30 dias e em caso de sintomas, acionar o técnico responsável.
Sintomas
• Tosse; baixa produção de leite; redução de peso; hematomas com pus e infecções na carne e feridas no úbere.
Sobre o exame
• As solicitações podem ser feitas nas secretarias municipais da Agricultura e em inspetorias veterinárias; os exames só podem ser feitos por veterinários especializados em tuberculose e cadastrados no Ministério da Agricultura e o custo do exame por animal varia entre R$ 10 e R$ 15, de acordo com o profissional.