A administração municipal ingressa hoje no Ministério Público (MP) solicitando investigação contra o ex-assessor parlamentar Carlos Augusto Portela, atual presidente do Diretório Central de Estudantes (DCE) da Univates.
O estudante omitiu, na época, sua renda de cerca de R$ 5,4 mil oriunda da Assembleia Legislativa para ser contemplado pelo Programa Bolsa Carência, destinado aos alunos de baixa renda de Lajeado com recursos do Executivo.
O estudante solicitou a bolsa no fim de março de 2011. No cadastro, Portela declarou não ter renda. Conforme a superintendência da Assembleia Legislativa, o presidente do DCE foi efetivado no cargo de assessor parlamentar do deputado estadual Luis Fernando Schmidt (PT) no dia 3 de janeiro de 2011, mais de dois meses antes de solicitar o benefício.
Mesmo recebendo seu salário de R$ 5,4 mil, ele foi classificado para receber o auxílio. A comissão responsável pela aprovação dos pedidos aprovou o equívoco sem uma investigação maior.
Durante todo o segundo semestre de 2011, o estudante foi contemplado com o valor de R$ 1.850. Portela também recebe auxílio do Financiamento Estudantil (FIES) e e foi beneficiado com o Bolsa Carência em 2010.
Após reunião com o diretório do Partido dos Trabalhadores (PT), Portela decidiu devolver no dia 9 de agosto cerca de R$ 2 mil à Univates, como compensação pelo uso do auxílio. Um dia depois, deixou de ser assessor parlamentar. “Pedi exoneração para participar da campanha”, afirma Portela.
Executivo aguardará investigação
Segundo o assessor jurídico da administração municipal, Juliano Heisler, o Executivo enviará ofício ao MP solicitando averiguação dos fatos. “Não se trata de uma acusação, queremos averiguar para depois tomarmos qualquer atitude.” Ele afirma que o valor devolvido à Univates ainda não foi repassado à administração municipal e que mudanças precisam ser estudadas para melhorar o funcionamento do programa.
Heisler afirma que a administração não teve conhecimento de outros casos envolvendo fraude dos documentos. Segundo ele, a responsabilidade pelo repasse é do Centro Universitário. “O Executivo apenas repassa os valores.” Em 2011, foram repassados R$ 350 mil para auxílio de 191 alunos cadastrados no Bolsa Carência. Este ano, foram investidos R$ 234 mil.
Respostas em caderno
Ao receber a reportagem do A Hora, Schmidt estava sentado no sofá da sede do PMDB e entregou um caderno com duas respostas resumidas. Evasivo, se limita a dizer que não foi informado por Portela que recebia auxílio da Univates.
Quanto à exoneração, justifica: “não tenho compromisso com eventuais incoerências.” Questionado sobre o envio da denúncia ao MP, pouco se manifestou. “Isso é tudo o que tenho para falar.”
Univates responsabiliza o aluno
A Univates se exime da responsabilidade de analisar de maneira minuciosa os documentos encaminhados pelos alunos. O interessado em receber o benefício da universidade entrega as informações em envelope fechado. O material é repassado ao setor Financeiro e de Controladoria, que faz uma triagem superficial.
Os assessores jurídicos Alex Herold e Leila Hammes dizem que a responsabilidade pelas informações é dos alunos, conforme consta no edital. A equipe de triagem verifica algumas informações.
Herold informa que algumas verificações são feitas no local. Cita como exemplo o local de residência do universitário e a declaração de Imposto de Renda. Caso constatem que more em um bairro nobre, ou que houve restituição, o máximo que a equipe pode fazer é solicitar esclarecimentos.
Leila salienta que há pesquisas nas redes sociais para verificar se as informações prestadas pelos alunos coincidem com o que é publicado na internet. “A triagem não é eliminatória”, admite Herold.
A comissão – formada por duas pessoas da universidade, uma do Executivo, uma do Legislativo, e uma do DCE – decidem quem receberá o benefício. As reuniões são divulgadas antecipadamente e são abertas à comunidade. Cada ficha de inscrição é analisada pelos integrantes.
Segundo Herold, só os integrantes têm poder de desclassificar. Supõe que a aprovação da bolsa carência a Portela se deve a um pedido de renovação. O presidente do DCE tem 100% de financiamento pelo Fies e apresentou os mesmos dados do ano anterior, fazendo a comissão acreditar que os dados foram inalterados.
“Eu assumo o meu erro”
Portela admite a fraude. Diz que solicitou o auxílio porque passava por dificuldades financeiras na época, decorrentes de processos judiciais contra sua família. “Eu era responsável pelo pagamento das contas e advogados. Mas isso não justifica a renda equivocada no documento.” O estudante não soube precisar o motivo da declaração de renda ilícita. “Eu estava em São Paulo quando o documento foi feito. Não é minha letra, mas não sei precisar quem preencheu para mim.”
O ex-assessor afirma que teve acesso ao documento depois de voltar da capital paulista. No entanto, diz que não reparou na declaração de renda equivocada. “Foi um erro meu, admito. O dinheiro eu devolvi, agora vou procurar a assessoria jurídica da Univates para ver o que fazer.”
Envolvido na campanha política à majoritária de Lajeado, Portela garante que seu ex-chefe, o deputado estadual Luis Fernando Schmidt, não sabia do Bolsa Carência. “Ele não tem como gerir a vida pessoal dos assessores.”
Como funciona o benefício
– A Univates abre o edital para inscrições ao Bolsa Carência – em parceria com o município – no início de cada ano;
– Entre os documentos, é necessário: comprovar residência em Lajeado, declaração de renda. O material é encaminhado em envelope fechado para o setor Financeiro e de Controladoria para análise;
– A equipe do setor faz uma triagem superficial – sem critério eliminatório , verificando quais documentos faltam. Após um cálculo de índice de carência (IC) é realizado. Quanto menor o IC, maior é a chance do candidato receber o benefício;
– Os dados são repassados para a comissão de benefícios, formada por seis pessoas, integrantes da Univates, Executivo, Legislativo e DCE. Eles não fazem uma fiscalização minuciosa sobre as informações prestadas;
– As reuniões são divulgadas por meio de internet e nos murais, e são abertas à comunidade. Pelo menos três pessoas têm que estar presentes para iniciar a análise dos benefícios. O Bolsa Carência é concedido por consenso, ao invés de votação;
– A comissão publica uma lista de pré-classificados à Bolsa Carência. Durante um curto período, qualquer estudante pode denunciar supostas irregularidades, que serão apuradas;
– O benefício é válido por um semestre.