O promotor Carlos Augusto Fioriolli quer a anulação do convênio da concessão do serviço de estacionamento rotativo pago de Lajeado por ausência de licitação. Ele aponta o acordo firmado há 16 anos entre administração municipal e Uambla como irregular e diz que não agiu antes para não causar desconforto à sociedade.
O promotor alega que para uma empresa (não estatal) administrar um serviço público, como o estacionamento, é preciso de licitação e depois concessão.
A entidade explora o serviço desde o dia 27 de fevereiro de 1996. Firmou um convênio por meio do prefeito da época, Leopoldo Pedro Feldens. A Uambla passou a gerir o sistema e se responsabilizou pela cobrança, pagamentos de funcionários, despesas e em aplicar os lucros em programas e atividades assistências na cidade.
Sobre a demora em contestar a irregularidade o promotor justifica: “Uma ação dessas só tumultuaria, uma vez que o trânsito tem ligação com o estacionamento. O fato causa um desconforto.” Segundo ele, agora é o momento oportuno para encaminhar o projeto, pois as mudanças no sistema viário foram concluídas.
A ação surgiu em novembro de 2011 por reclamações de motoristas. Em seguida, foi instaurado um inquérito civil público com prazo de seis meses para o promotor investigar. Foram ouvidas pessoas e construído um dossiê.
Na semana passada, a ação foi encaminhada à Justiça. Com a anulação do convênio a Promotoria pediu que seja declarado indevidos todos os débitos que a entidade lançou no sistema e as autuações de trânsito feitas pelos guardas municipais. O promotor ressalta que o convênio expirou em 31 de dezembro de 2011 e não foi renovado até fevereiro. Contudo, pelo menos 230 autuações foram aplicadas em janeiro.
Outro pedido foi a suspensão do serviço até o julgamento do processo. A juíza da 1ª Vara Civil de Lajeado, Débora Gerhardt de Marque negou porque o efeito poderia causar prejuízo para a Uambla e dificuldades aos motoristas, “considerando o caótico trânsito no centro”. O promotor não pretende recorrer da decisão.
A administração municipal e a Uambla receberam a intimação judicial na manhã de ontem. Conforme o assessor jurídico do município, Marcelo Caumo, tem 60 dias para apresentar uma defesa. Até lá pretendem estudar o processo antes de falar sobre o caso.
Representantes da Uambla dizem que o município nunca contestou porque o serviço sempre teve prestação de contas, e os lucros foram investidos na comunidade, como a informatização do sistema que beneficiou com internet gratuita no centro.
Estrutura da Uambla
A entidade tem hoje 50 funcionários que trabalham com carteira assinada e recebem por mês o piso regional de R$ 700 mais benefícios. Há três anos não há reajustes nos valores cobrados dos motoristas – R$ 0,75 para 30 minutos e R$ 1,25 para uma hora.
Conforme a administração da Uambla, desde 2008 o piso aumentou todos os anos. Antes era pago R$ 477,4 e passou para R$ 700. Até agora o Tribunal de Contas do Estado não apontou o município sobre a forma do processo.
Essas mudanças nos últimos anos afetaram o caixa da entidade, que desde 2009 encerrou com saldos negativos (veja boxe na página ao lado). No fim de 2011, a Uambla fez um empréstimo de R$ 30 mil para pagar o 13º salário dos funcionários.
O presidente e o tesoureiro da entidade, que são voluntários, foram avalistas para conseguir o dinheiro. Dados do setor administrativo revelam que hoje há 35% de inadimplência no pagamento dos motoristas.
São atendidos cerca de 30 mil veículos por mês. Destes, 50,6% são de Lajeado, 33% da região, 13,6% do estado e 2,7% do país. De acordo com dados do Departamento Municipal de Trânsito de Lajeado, as multas começaram a ser cobradas de forma efetiva em 2012. Foram 549 desde janeiro.
“O município deveria assumir o controle”
Em entrevista o promotor Carlos Augusto Fioriolli esclarece o motivo da ação e por que contesta o serviço só agora.
Jornal A Hora – Por que foi movida a ação?
Promotor – O processo visa a anulação de um convênio entre a administração municipal e a Uambla. Ele repassa o controle do estacionamento rotativo de Lajeado. O estacionamento como serviço público, para ser passado para uma terceira pessoa, deve ter um ato de concessão – neste caso um procedimento de licitação. E isso não ocorreu.
Hoje, o procedimento jurídico firmado entre as partes é feito por convênio. Um ato precário que não permite esse tipo de exploração. Ele se faz em atividade temporária com interesse dos dois lados.
– Por que a Promotoria agiu só agora?
Promotor – Em 1986, não tínhamos a lei de licitação, criada em 1991. A Uambla assumiu há 15 anos o processo, mas era pequena, assim como a cidade. Antes o sistema de cobrança de trânsito estava se formando e era incipiente. Há dois anos a cidade resolveu fazer uma mudança radical no trânsito.
Uma ação dessas só tumultuaria, uma vez que o trânsito tem ligação com o estacionamento. Com a consolidação das mudanças no sistema viário, agora se tornou o momento oportuno para encaminhar uma ação que exige o processo licitatório. O fato causa um desconforto. Não é momento de confluência eleitoral, não tem nada a ver com isso.
– A irregularidade é um crime?
Promotor – Não está sendo investigado crime e nem improbidade administrativa. Não estamos avaliando o caixa da entidade, ninguém cometeu nenhum ato de gestão. A cidade se organizou para fazer um bom estacionamento. Não tem nenhuma mácula ou ponto mal esclarecido na gestão.
Mesmo todos fazendo o seu melhor eu preciso, como promotor, olhar para a legislação que obriga a cobrar o município a concessão mediante licitação. É só uma falta de adequação legal.
– O município pode assumir a gerência?
Promotor – O município não só pode como deveria assumir o controle. Ele tem o poder de executar o serviço ou transferir para terceiros. E isso só pode fazer de duas formas: concessão ou permissão. Os táxis, que são motoristas individuais, são por permissão. Os ônibus e rodoviária são por concessão, assim como o estacionamento também deve ser.
– Como vê o estacionamento rotativo pago de Lajeado?
Promotor – Agora que está se olhando para o estacionamento é preciso pensar no tipo de estacionamento que a sociedade quer. O daqui é pago e não rotativo, porque é possível comprar a vaga pelo dia inteiro. Ele é semelhante com o das pessoas que têm garagens e as alugam por um valor/mês.
Como cidadão, prefiro que o estacionamento público seja rotativo. Pode ser por parquímetros ou pessoas. O motorista paga o tempo que projeta ficar na vaga, tudo é com o motorista, ele administra todo processo.
Diretor de trânsito processa Uambla
Tramita na Justiça de Lajeado um processo por danos morais do diretor do Departamento de Trânsito, Luis Felipe Finkler, contra a Uambla. Ele alega que a entidade cobrou de forma indevida mais de R$ 200 em estacionamento rotativo e repassou as informações para a imprensa.
Ele conta que estacionou seu veículo num local quando não tinha cobrador e só voltou às 12h15min. Ele diz que não deve para a Uambla e que a lei não diz que é preciso acertar pendências na sede da entidade. “Se tu estacionar teu carro e não tiver cobrador quando tu sair daqui tu não tem que correr atrás dele. Esse é meu ponto de vista (sic).” O diretor salienta que o fato gerou problemas internos com os fiscais, que o questionavam sobre dívida.
Sobre a ação do MP, diz que a juíza agiu certo em não aceitar a suspensão do serviço porque a cidade viraria um caos sem o estacionamento pago. Ele questiona o motivo pelo qual não foi verificada a irregularidade antes, visto que faz 15 anos que a entidade tem convênio com o município.
Ele considera o estacionamento fundamental para a cidade, independentemente do processo. A cobrança do estacionamento é lei municipal.
O que diz a lei:
– Os veículos poderão permanecer estacionados num mesmo local no máximo de até duas horas;
– Não há tolerância de minutos permitidos;
– No caso de constatação de falta de pagamento, o condutor receberá um Auto de Infração;
História do estacionamento
30/12/1985:
por lei municipal foi instituído o estacionamento rotativo pago em vias públicas de Lajeado. Era o Executivo que gerenciava o processo com quatro cobradoras;
19/11/1990:
a exploração do serviço foi transferida para o Conselho Comunitário Pró-Segurança (Consepro);
29/09/1993:
mudou a lei autorizando que o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente (Comudical) fossem os responsáveis pelo serviço;
17/01/1996:
nova lei disciplinou o estacionamento rotativo, autorizando transferência da exploração para qualquer entidade assistencial, social, filantrópica ou privada. Assim a Uambla assume a administração;
13/07/2005:
a lei autoriza o Executivo a transferir por convênio a exploração