O Ministério Público (MP) de Teutônia investiga a a Cooperativa de Agricultura Familiar, que incluiu de maneira indevida o nome de mais de mil produtores da região como associados. O mecanismo era usado para fraudar o fornecimento de merenda escolar às escolas públicas municipal e estadual.
Segundo o promotor Jair Franz, este é o principal indício de que a cooperativa funcionava de maneira irregular. “Ela não pode existir se não tem filiados”, sentencia.
Foram incluídos na lista os nomes de moradores de Estrela, Colinas, Bom Retiro do Sul, Fazenda Vilanova, Teutônia e Westfália. Os produtores desconheciam esta cooperativa.
O promotor acredita que a cooperativa foi criada para receber dinheiro federal de maneira irregular. O programa destina até R$ 9 mil por produtor associados às cooperativas que ganharem o direito de oferecer merenda às escolas públicas municipais e estaduais.
Franz afirma que os produtos eram repassados por indústrias – o que é proibido. Conforme a legislação, para participar do Pnae, a merenda escolar deve ser composta de, pelo menos, 30% de produtos da agricultura familiar.
Caso se confirme, a fraude pode chegar a R$ 9 milhões.
Dois endereços
O promotor apura os endereços fornecidos pela cooperativa, durante a participação de chamamentos públicos para fornecer a merenda escolar: um em Teutônia e outro em Fazenda Vilanova.
Franz afirma que o primeiro não é verdadeiro. No local, funciona uma outra empresa. Em depoimento ao promotor, o empresário negou ter participado da fraude. A outra localização segue investigada pelo MP.
Desconfianças
As informações foram fornecidas ao MP pela presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Teutônia e Westfália, Liane Brackmann. Em março, ela recebeu uma reclamação de uma cooperativa de Harmonia, no Vale do Caí. Os proprietários daquele empreendimento afirmaram que perderam o fornecimento de merenda para diversas escolas municipais devido a esta cooperativa fantasma.
Liane desconhecia o nome e pediu mais informações. Ao receber o estatuto da suposta cooperativa, verificou que diversos produtores participavam de outras associações. Estes, também desconheciam a inclusão na lista irregular.
O fato chamou a atenção de Liane que acionou o MP. A Organização das Cooperativas do Estado do Rio Grande do Sul (Ocergs) também apura a irregularidade da Cooperativa Gaúcha de Agricultura Familiar.
Segundo o presidente da Ocergs, Vergílio Perius, os proprietários tentaram regularizar a situação. O número de associados causou estranheza a Perius. “É difícil uma cooperativa que está começando ter mais de 500 associados de uma hora para outra.”
O processo está sendo investigado pelo Conselho de Ética da Ocergs, em paralelo ao iniciado pelo Ministério Público teutoniense.
Produtores surpresos
A inclusão na lista de associados da cooperativa irregular surpreendeu os produtores rurais. Um deles é Ademir Cord, da Linha Paisandu, em Westfália.
Avicultor, fornece os produtos para a Cooperativa Languiru. Também é associado da Sicredi. “Nunca tinha ouvido falar dessa tal de cooperativa e me surpreendi quando vi que meu nome estava na lista.”
Conforme Cord, ele não foi perguntado se queria pertencer ao quadro de fornecedores. Ao saber da irregularidade, registrou um boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia. O documento é usado na investigação do MP.
Como funcionava
– A Cooperativa Gaúcha de Agricultura Familiar obteve a Declaração de Aptidão (DAP) de diversos produtores rurais do Vale do Taquari e usou-os como associadas. Mais de mil foram incluídos na lista irregularmente, de Bom Retiro do Sul, Colinas, Estrela, Fazenda Vilanova, Teutônia e Westfália;
– A cooperativa tem direito a participar do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). O programa federal dispensa a abertura de licitação para os interessados, facilitando as fraudes;
– O repasse para cada produtor associado pode ser de até R$ 9 mil, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (Fundeb). O programa obriga que a merenda escolar tenha, pelo menos, 30% dos produtos provenientes da agricultura familiar;
– Caso comprovada a fraude, podem ter sido desviados até R$ 9 milhões de recursos federais.