Menor nível em 60 anos

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Menor nível em 60 anos

O nível da água do Rio Ta­quari atinge marca his­tórica. Em alguns pontos, a profundidade é inferior a 50 centímetros e possibilita a tra­vessia a pé. A situação põe em risco o abastecimento para consumo hu­mano, navegação, geração de ener­gia, pesca e a reprodução dos peixes. Segundo relato de moradores, esta é a pior estiagem dos últimos 60 anos.

sNos três primeiros meses deste ano choveu 297 milili­tros a menos do que o mesmo período de 2011. Pescado­res locais são obrigados a busca­rem outras regiões para encontrar sustento à sua família.

João Ferreira e mais dois cole­gas, de Roca Sales, navegam nas águas do Rio Taquari há quase 40 anos. Com dificuldade na pes­ca, o grupo irá para a fronteira do estado, no Rio Uruguai. Pesca­vam 30 quilos de peixe por mês, em média. “Agora tem dias que não pegamos nada. Ficamos ho­ras debaixo do sol sem sucesso. Não sei o que está aconte­cendo”, observa Ferreira.

O baixo nível da água prejudica, sobretudo, a navegação. Para que os cargueiros possam viajar pelo Rio Taquari, o Porto Fluvial de Estrela depende da Eclusa de Bom Retiro do Sul, que equilibra a quantidade de água na parte superior à barragem.

Conforme o responsável pela medição no porto, Ronaldo Silveira, o nível da água está em 13 metros, mas no trecho abaixo da barragem, a profundidade dos canais não ul­trapassa os 2,2 metros.

Observa que os cargueiros dei­xam de vir à região porque não conseguem transportar a capacidade necessá­ria. “É possível viajar com o navio vazio, mas de que adianta. Se não chover nos próximos dias, teremos sérios problemas.”

O veterinário Erno Miltner, de Roca Sales, perdeu as duas safras de milho devido à falta de chuva. Ele mora há mais de 60 anos ao lado do Rio Taquari e não se re­corda de quando o nível da água esteve tão baixo.

Miltner comenta que desde agosto de 2011 não chove para re­por a deficiência hídrica do solo. “Nunca tivemos uma escassez de água tão grande como temos agora. Está na hora de poupar, caso contrário faltará água até para as funções básicas.”

Em 2011, o chefe do Centro de Pes­quisas e Provisões Meteorológicas da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), Gilberto Diniz previa que esta seria a estação com a menor média de chuvas das últimas déca­das. “Se confirmou. Tivemos chuvas muito aquém do necessário.”

A estiagem se deve ao fenômeno meteorológico La Niña, que atua sobre o estado desde 2010. Com isso, as frentes frias se formam com me­nos frequência. A previsão de pes­quisadores é que o fenômeno aja até novembro.

Moradores se preocupam com o Taquari

O agricultor Macedo Saatkamp, do dis­trito de Palmas, em Arroio do Meio, diz que há mais de seis décadas não se teve um ve­rão tão quente e pouco chuvoso. “O sol está queimando tudo. Nem as frutas suportam o calor. Se chove, é só para refrescar um pouco, mas não é o necessário.”

Observa que há vários anos o volume de água no Rio Taquari não fica tão bai­xo. “Em vários pontos é possível cruzar a pé. Há mais de 50 anos não apareciam no leito do rio as pedras onde antigamente tínhamos uma travessia para o lado de Colinas.”

Outro fato que preocupa é a falta de água em mananciais. Lembra que em sua propriedade tinha um poço que abastecia toda produção de suínos, frangos e gado leiteiro e ainda era fonte hídrica para mais duas famílias. “Há dez anos, a fonte secou, virou pó (sic). Acho que as ações do homem estão prejudicando a natureza e todos nós sofreremos pela falta de cuidado com os recursos naturais.”

Hidrelétricas trabalham com capacidade reduzida

A Certel, que opera com as centrais hidrelétricas em Salto Forqueta e em Boa Vista informa que a va­zão dos leitos está reduzida. “A geração de energia está em 20% da capacidade total”, afirma o diretor de geração da cooperativa, Julio Cesar Salecker.

A solução para não haver racionamento de energia elétrica nestas condições está no Siste­ma Interligado Nacional, que conta com o apoio de grandes usinas hidrelétricas, como Itaipu, no Paraná e Tucuruí, no Pará, que têm água repre­sada nas estruturas e ajudam as barragens me­nores. “Quando a vazão é pequena, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) aumenta a geração nas usinas com grandes lagos, aciona as termelétricas e, em último caso, restringe car­ga”, observa.

Salecker acrescenta que a média mensal de precipitações precisa voltar ao normal, entre 120 e 170 milímetros/mês, para manter o for­necimento. Ressalta que, se chover uma média de 15mm/semana, o problema é amenizado. “Existe sempre uma crítica muito forte à cons­trução de grandes usinas devido aos impactos ambientais, mas elas são fundamentais para que tenhamos energia com confiança de forne­cimento”, avalia.

Estiagens históricas

No Vale do Taquari, a pior estia­gem foi registrada entre 1943 e 1945. Neste período houve apenas chuvas esparsas. Conforme o historiador José Alfredo Schierholt, a seca se prolon­gou por vários meses, provocando a perda total das safras.

As estiagens mais recentes ocorre­ram em 1985 e 1996. Para amenizar as perdas, o governo do estado criou o Cheque Seca. O valor era de R$ 400 por agricultor atingido. O dinheiro po­deria ser pago em duas prestações, com juros anuais de 6%.

Com dificuldades de pagamen­to, em 12 de setembro de 2002 foi assinada a anistia do Cheque Seca de R$ 3,3 milhões para 5.116 famí­lias em todo o estado. Os verões de 2004, 2005 e 2006 voltaram a cas­tigar a região com perdas nas lavou­ras que chegaram a 90% em alguns municípios.

A seca mais antiga da qual se tem registros aconteceu de 1876 para 1877, quando foi registrada pela primeira vez os fenômenos La Niña e El Niño.

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