Num quintal com cerca de 400 metros quadrados no bairro São Cristóvão, em Lajeado, Lucia Zanatta abriga 23 cachorros de diferentes raças e tamanhos. Há oito anos, recolhe os bichos da rua. Com o apoio do filho e marido, alimenta e cuida dos animais.
Desde criança é apegada a cachorros. Quando um é maltratado, leva para a casa. “A maldade humana não tem limite.” A ação custa-lhe caro. O gasto mensal chega a R$ 1 mil. O custo aumenta quando ela encontra um que esteja doente e precise de tratamento.
O Executivo ofereceu apoio e concedeu uma licença ambiental, para que possa cuidar dos cães sem incômodo. Ela garante que não há procriação, pois todos são castrados.
Lúcia instalou câmeras de vigilância no pátio para inibir a ação de algumas pessoas que largam cães no local. Até pouco tempo, eram muitos os que se aproveitavam do trabalho dela.
Ela sugere às autoridades para que fiscalizem mais durante o veraneio, quando os casos de abandono aumentam. As férias são o principal problema. “As pessoas viajam e deixam os bichinhos largados na rua.”
Cachorros vivem em bueiro
Cruzeiro do Sul – Há uma semana, uma cadela e três filhotes foram abandonados numa valeta, na comunidade de Picada Augusta. Para se proteger, os animais se esconderam em um bueiro. O fato comoveu os moradores do entorno, que desde então os alimentam.
De acordo com Marabete Nonemacher a situação é recorrente. “As pessoas aproveitam para deixar os animais aqui, pois não há punição.” Os moradores acionaram a administração municipal, que alegou não ter canil para acomodar os cachorros.
O município não tem central de zoonoses e nem abrigo para os animais. Os abandonados são encaminhados ao Executivo que procura por possíveis adoções. Conforme a secretária da Administração Aline Flores, setores públicos iniciaram uma discussão para construir um canil, mas o projeto não evoluiu.
Abaixo-assinado contra o abandono
Santa Clara do Sul – O caso mais recente é no loteamento Popular. Mais de 15 famílias aderiram a um abaixo-assinado, cobrando providências do Executivo contra um morador que cria sete cachorros soltos. Quando perguntado sobre porque não toma iniciativas, resume: “não posso prendê-los.”
O confeiteiro Vanderlei Eichler, 43, reclama do descaso. Todos os dias precisa limpar o pátio da padaria, devido ao acúmulo de fezes. Cita outros dois problemas: os lixos revirados pelos animais e o barulho à noite, interrompendo o descanso dos moradores.
O Executivo se exime da responsabilidade. O setor de inspeção afirma que o dono é quem deve encontrar uma maneira de acabar com o problema. Uma das medidas, paliativas, é pedir para o proprietário que prenda os animais ou doe para uma Organização Não Governamental (ONG). “O problema é que as organizações têm poucos recursos. São alternativas, mas não a solução.”
Serviços básicos são suspensos
Estrela – A irresponsabilidade de alguns proprietários prejudica serviços básicos, como a entrega de correspondências. Animais soltos pelas ruas atrapalham a ação dos carteiros.
Outro caso que alerta a administração municipal está relacionada aos maus-tratos. A secretária de Meio Ambiente, Ângela Schossler cita que medidas para coibir a prática ilegal são elaboradas pelo Executivo.
Como forma de diminuir o número de cães soltos, a administração municipal construiu um canil em 2011. O local, na Linha Delfina, recebe apenas casos extremos de maus-tratos e de abandono. “Não temos capacidade para alojar todos os animais.”
Ângela observa que os animais não podem ficar muito tempo no local. “A proposta é doar os cachorros o mais rápido possível.” No último semestre de 2011, cem cães foram recolhidos e doados. Para ficarem com os bichos, os novos proprietários devem assinar um termo de compromisso.
Monitoramento por chips
Lajeado – A Secretaria de Meio Ambiente (Sema) começou, no segundo semestre de 2011, um levantamento para contabilizar quantos cachorros há no município. O trabalho é feito pelo Centro de Controle de Zoonoses e Vetores (CCZV) e tem a ajuda das agentes de saúde.
O município prevê implantação de chips nos animais. Foram comprados 1,8 mil unidades. Cada uma tem cerca de um centímetro e é aplicado sob a pele do animal. A Sema acredita que a ação ajudará na identificação dos animais soltos pelas ruas.
Até o momento, 6.207 famílias foram entrevistadas. Destas, 73,2% têm animais de estimação. Foram contados 7.108 cães e 2.253 gatos em 19 bairros do município. O número é inferior à estimativa do Executivo, de que tenha 20 mil cachorros nas ruas do município.
Abrigo improvisado
Arroio do Meio – Não há abrigo municipal. Os animais largados nas ruas são acolhidos pela Associação de Proteção de Animais, que num local improvisado, no bairro Bela Vista, cuida da saúde e os alimenta.
A infraestrutura é precária e moradores do entorno reclamam do mau cheiro. No segundo semestre de 2011 a administração municipal doou uma área de terras para a associação, que constrói um canil.
De acordo com um dos integrantes da associação, o fato de haver quem cuide de cães e gatos abandonados aumenta o número de abandonos. “As pessoas aproveitam e os largam pelas ruas. Deveria haver uma punição mais rígida a quem faz isto.”
Falta conscientização
Teutônia – Não há um canil no município. O trabalho é feito por meio da Associação de Proteção de Animais de Teutônia (Apate). O poder público encaminha R$ 2,4 mil por mês à entidade para recolher e tratar os animais.
O secretário de Agricultura e Meio Ambiente, Luiz Fernando Rüchert não prevê a construção de um abrigo municipal. Afirma que a parceria funciona, mas reconhece que falta espaço para atender a demanda.
O bairro Centro Administrativo é um dos locais com mais incidência de abandono. Rüchert acredita que os teutonienses largam os animais por saberem que a administração municipal os recolhe.
“Muitos acham bonito quando os animais são pequenos, mas depois que crescem querem se livrar deles.”
Voluntários protegem animais
Encantado – O município paga R$ 1,5 mil todos os meses para uma pousada particular cuidar e tratar os animais abandonados. Não há abrigo municipal.
O repudio aos animais domésticos ocorre, sobretudo em bairros mais afastados do centro. Mesmo com o auxílio da pousada, alguns bichos continuam nas ruas, pois há um número limite no abrigo: 30 cães.
Em 2007, foi fundada a Associação Encantadense de Defesa dos Animais (Aeda) para auxiliar nos cuidados. A ONG não tem abrigo e os voluntários levam os animais para suas casas, até uma possível doação.
Segundo a presidente da ONG, Salete dos Santos Ferreira, há cerca de 30 gatos e 17 cães sendo cuidados e alimentados. São dez associados que trabalham diretamente, somados os colaboradores de doações de medicamentos e alimentos.
A culpa é do ser humano
Quando alguém abandona o animal, expõe a comunidade a doenças. Segundo o veterinário Otomar José Ferronatto, de Lajeado, os bichos recorrem às lixeiras para se alimentar. E nestes locais há ratos, possibilitando a transmissão de leptospirose. A doença é rara. Os sintomas podem aparecer até 26 dias depois da contaminação. Em alguns casos, a pessoa contaminada pode morrer.
As parasitas são mais comuns. Em situação de abandono, os animais têm mais facilidade para pegar sarna e pulga. A primeira pode ser transmitida para as pessoas, enquanto que a segunda pode se aglomerar em locais sujos.
Maus-tratos
A legislação brasileira protege os animais desde 1934, mas só em 1998 uma nova lei definiu o que são os crimes ambientais. A pena varia de três meses a um ano de detenção, mais multa.
Confira o que são considerados maus-tratos:
– Ferir ou mutilar qualquer animal (domésticos ou exóticos);
– Abandono;
– Experimentos científicos que coloquem a vida dos animais em risco.