A duplicação da BR-386 está prestes a ser interrompida. A Conpasul retirou parte do maquinário usado na obra para evitar a ociosidade. O principal motivo para a decisão é a burocracia brasileira.
Os trâmites acabaram com a projeção do empresário Nilto Scapin de mostrar à sociedade que é possível concluir uma grande obra antes do prazo. O contrato, assinado em novembro de 2010, determina o término da duplicação em novembro de 2013, mas Scapin queria antecipar em um ano.
Os empecilhos são dois órgãos federais: o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Fundação Nacional do Índio (Funai). O primeiro analisa, há 60 dias, o pedido de exploração da jazida do quilômetro 372, em Fazenda Vilanova.
Por parte da representação indígena, está a demora em realocar os cerca de 200 caingangues que vivem à margem da rodovia, entre Estrela e Bom Retiro do Sul. A Funai ainda negocia com o Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (Dnit), mesmo com a nova área comprada há quase seis meses.
Enquanto a definição não ocorre, nove dos 33,8 quilômetros da obra permanecem inalterados. Os índios ocupam um espaço de 900 metros de extensão.
Scapin questiona o entendimento da Funai. Para ele, poderiam ser liberados sete dos nove quilômetros, para que a duplicação não seja prejudicada. “Se continuar desta forma, teremos que paralisar a obra.”
Em fevereiro a equipe deverá ser encaminhada para outras obras que a construtora tem.
O problema será sentido pela comunidade em dois aspectos: a possibilidade de mais mortes ocorrerem no trecho – só neste ano foram 13 – e um aumento do custo da duplicação, ainda não estimado. Dependerá do tempo de interrupção.
Scapin lamenta as condições de trabalho do Iphan. O instituto conta com apenas um técnico para atender e fiscalizar a demanda gaúcha. Com isso, o prazo para a análise das jazidas é estipulado em 90 dias. “Este é um problema, porque temos que conversar com os proprietários para a compra das terras.”
No projeto consta a necessidade de explorar, pelo menos, 17 jazidas. Destas, 14 foram liberadas – a maioria pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama).
O empresário acrescenta que, em grande parte delas, o material é de menor qualidade, inviabilizando a conclusão do asfaltamento aplicado nos últimos meses. Devido a essa demora, as dez equipes contratadas para a retirada dos vegetais foram desmobilizadas.
O Dnit não quis se manifestar.
A falha da comissão
Scapin afirma que a desmobilização de mais funcionários é iminente e apresenta outra preocupação: a possibilidade de não concluir a obra no tempo determinado pelo Dnit. Ele estima que, neste ritmo, a finalização ocorrerá em até seis anos.
O clima dos líderes regionais é de revolta. O presidente da Câmara de Indústria e Comércio (CIC-VT), Oreno Ardêmio Heineck é categórico. “Não dependo destes burocratas gigolôs do dinheiro público”, esbraveja. “Não fazem jus à procuração que o povo lhes passou ao serem contratados e enxovalham a grande maioria do funcionalismo público que é extremamente eficiente e competente.”
O presidente da Associação Comercial e Industrial de Lajeado (Acil), Valmor Scapini faz coro à revolta. Ele solicita uma mobilização maior da sociedade para agilizar a obra. “Se nós trabalhássemos como o governo federal, a maioria dos empresários estaria quebrada (sic).”
Scapini reconhece que os líderes regionais erraram estrategicamente. A duplicação entre Tabaí e Estrela nem foi concluída e iniciaram outra reivindicação.
Ele acrescenta que isto é comum no meio empresarial. “Para nós, quando fechamos um acordo, está acordado e partimos para outra prioridade.” O presidente do Conselho Regional de Desenvolvimento (Codevat) e reitor da Univates, Ney Lazzari, concorda.
Segundo ele, lutar por outra duplicação é uma maneira de mostrar aos governantes sobre a necessidade de agilizar as obras iniciadas para que o estado não seja prejudicado.
Ele informa que os integrantes da comissão pela obra atual devem se reunir para pressionar os órgãos federais.
Os motivos da ameaça
O que: Tribo indígena
Onde: Divisa entre Estrela e Bom Retiro do Sul
Motivo: A Funai, há mais de um ano, faz exigências ao Dnit para autorizar a realocação dos cerca de 200 caingangues que vivem à margem da rodovia. Enquanto a liberação não ocorre, a Conpasul está impedida de trabalhar em um trecho de nove quilômetros – de um total de 33,8 quilômetros.
O que: Liberação de jazida
Onde: Quilômetro 372, em Fazenda Vilanova
Motivo: A solicitação de vistoria foi encaminhada há 60 dias para o Iphan, que ainda não visitou o local. A demora impede a retirada de argila considerada nobre, essencial para finalizar a pavimentação feita pela construtora.
O que: Desmobilização da equipe
Onde: Diversos pontos
Motivo: Devido à demora de ação do Dnit, Iphan e Funai, a Conpasul decidiu realocar parte da equipe para outras obras contratadas. A empresa reduziu: de 200 para 150 o número de funcionários no local; de 50 para 25 o número de caminhões; de 30 para 28 as máquinas,
responsáveis pela retirada de argila e quebra de britas; e de dez equipes de retirada de vegetais.
O que: Outra duplicação
Local: Lajeado a Tio Hugo
Motivo: A comissão pela duplicação da BR-386 entre Tabaí e Estrela considerou como concluída a obra e decidiu fazer outra reivindicação: ampliar as faixas da mesma rodovia entre Lajeado a Tio Hugo. Com isso, houve uma concentração de forças para que este novo pedido fosse atingido, diminuindo a mobilização inicial e considerada prioritária para a região.
Entenda o caso da duplicação
Maio de 2004:
Líderes de seis municípios formam uma comissão para lutar pela duplicação da rodovia;
Agosto de 2006:
O Vale do Taquari lança a campanha “Duplicação da BR- 386: Duplique esta ideia”;
Dezembro de 2009:
Ibama concede a licença para duplicar a rodovia, abrindo caminho para a publicação da licitação;
Julho de 2010:
É dada a ordem de início da obra;
Novembro de 2010:
Consórcio formado pela Conpasul e Iccila começam a duplicação;
Janeiro de 2011:
Índios caingangues ameaçam bloquear a obra caso as exigências não sejam atendidas. Em reunião realizada dia 26, Dnit se compromete a cumprir o acordo;
Outubro de 2011:
Dnit demora para renovar o contrato com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), responsável pela gestão ambiental da duplicação. Transtorno fez a Conpasul desistir de concluí-la em 24 meses devido
ao impasse;
Novembro de 2011:
Scapini informa que 34% da obra está concluída. Ritmo lento das negociações pode atrapalhar o cronograma do Dnit, estendendo o prazo para até seis anos.
Opiniões
Oreno Ardêmio Heineck
Presidente da CIC-VT “(Os órgãos federais) Não fazem jus à procuração que o povo lhes passou ao serem contratados e, enxovalham a grande maioria do funcionalismo público que é extremamente eficiente e competente.”
Nilto Scapin
Diretor da Conpasul “Nós queríamos mostrar para o Brasil que poderíamos terminar uma obra deste porte antes do prazo, mas a burocracia impede isso.”
Ney Lazzari
Presidente do Codevat “O governo federal está se matando porque têm diversos órgãos, um com maior poder que o outro, não decidem nada e acabam prejudicando a região.”
Valmor Scapini
Presidente da Acil “Se nós trabalhássemos como o governo federal, a maioria dos empresários estaria quebrada (sic).