Em setembro a população mundial relembra os dez anos dos atentados terroristas contra as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York. No Vale do Taquari, o mês traz à tona as lembranças do tufão que atingiu Lajeado em 1967, deixando mortos, feridos e espantosa destruição pelo caminho. |
Era pouco mais de 5h30min quando iniciou um forte vendaval acompanhado de granizo. O que ocorreu após um pequeno intervalo de 180 segundos foi algo semelhante às grandes catástrofes verificadas em países como Estados Unidos, ou em grandes produções cinematográficas.
Ventos de até 200 quilômetros por hora destruíram prédios, casas, pavilhões, galpões, postes e automóveis. Em menos de três minutos o tufão matou seis lajeadenses. Alguns esmagados por paredes e telhados que despencaram sobre famílias inteiras, outros atingidos pelas telhas de zinco que voavam como navalhas pelo centro da cidade.
Na antiga Picada do Carneiro (hoje bairro Carneiros) a família Yung sofreu com a fúria da natureza. Dos dez filhos, sete foram hospitalizados e dois não estavam em casa no momento da tragédia. O outro teve menos sorte. Marino, 22 anos foi arremessado para dentro de um pequeno riacho. Ele morreu após ser “prensado pelo vento contra a água”, conforme publicação de um periódico da época. A família deixou a cidade após o evento.
O medo retorna a cada temporal
Com 23 anos na época, o professor aposentado Érico Inácio Heisler lembra com detalhes do dia mais assustador de sua vida. O tufão iniciou logo após seu pai acender o fogão a lenha pela manhã. Junto com outros seis familiares, ele se refugiou debaixo de uma mesa para se proteger das telhas de zinco e dos tijolos que voavam em direção a eles.
Pouco restou da casa localizada na rua Coronel José Diehl, em Santa Clara do Sul, que na época pertencia a Lajeado. Ela foi destruída junto com o galpão e o forno de fumo. “Foi tudo muito rápido, questão de minutos. Lembro que encontramos partes da casa a mais de dois quilômetros de distância.”
Por sorte ninguém se feriu, assim como seus vizinhos. Heisler lembra de uma casa próxima da sua que “voou” sobre a Av. 28 de Maio. “Ela caiu de cabeça para baixo, e o casal que estava na cama nada sofreu.” A velocidade com que o granizo atingia as árvores e as paredes de sua casa são lembranças difíceis de esquecer. Passados 44 anos da tragédia, ele ainda sente receio mediante qualquer indício de temporal. “Sinto medo sempre que um vento mais forte chega à cidade.”
Resultado da catástrofe
Entre os prédios destruídos estava o antigo salão paroquial, que se localizava ao lado da Igreja Matriz. Do antigo pavilhão da Festa Nacional de Laticínios (Fenal) – hoje reconstruído com o nome de Parque do Imigrante – , pouco sobrou. Assim como o Centro de Reservistas de Santa Clara do Sul.
As ruas ficaram intransitáveis. Postes e árvores foram derrubados e quase um metro de granizo ficou acumulado nas vias. O cenário era de guerra na cidade que possuía quase 50 mil habitantes. O comércio parou e a energia demorou a ser religada. Além dos mortos houve registro de 60 pessoas feridas, 39 das quais hospitalizadas. O tufão deixou ainda mais de dois mil flagelados, e matou milhares de animais. Lajeado virou notícia nacional, estampadas nos mais tradicionais jornais gaúchos da época.
O prefeito, Dalton de Bem Stumpf, junto com o governador Perachi Barcellos, enviaram telegramas ao presidente Costa e Silva requisitando recursos. Mas, pouca ajuda chegou, e a reconstrução dependeu mais da própria comunidade, conforme citação do próprio prefeito para o jornal Correio do Povo. “A violência do temporal só serviu mesmo para realçar o alto espírito de solidariedade humana do povo de Lajeado”.
“Parecia que vivíamos o fim do mundo”
O advogado Paulo Arenhardt lembra alguns comentários da comunidade após o evento. Como o tempo permaneceu chuvoso nos dias seguintes, havia quem dissesse que o mundo acabaria. Ele morava no bairro Florestal, e na época com 12 anos, saiu para caminhar pela cidade após acordar com o barulho do granizo. “Havia muitos postes espalhados pelas ruas, e quase um metro de granizo acumulado em alguns pontos.”
Algumas cenas eram chocantes. Conforme Arenhardt, uma moradora foi atingida no pescoço por uma telha de zinco que se soltou do telhado do antigo cinema Alvorada. A vítima estava em frente do local onde hoje funciona uma concessionária da Fiat. Ele comenta ainda a morte de uma figura tradicional da cidade, conhecida como “Mudinha”. Ela era uma andarilha e acabou atingida por destroços. “Parecia o fim do mundo.”
“Minha irmã voou quase 25 metros”
Apenas o assoalho da residência de Ruy Ruben Rieth, hoje vice-presidente do Sicredi de Lajeado, ficou intacto. Por um acaso da vida ele não estava em casa no dia da tragédia. Mas, lembra com detalhes do pavor pelo qual seus pais e sua irmã passaram. “Minha irmã de 4 anos foi arremessada junto com o berço por quase 25 metros e nada sofreu. Meus pais foram internados com algumas escoriações.”
A casa de madeira se localizava em um terreno ao lado da Clínica Central, no bairro Carneiros. Próximo dali morreu o jovem afogado. Para Rieth, a tragédia não teve proporções maiores devido ao horário em que ocorreu. “Se fosse uma hora mais tarde haveria mais vítimas, pois no momento do tufão poucas pessoas estavam fora de suas casas.”