Lei falha

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Lei falha

Vender, fornecer ou permitir o consu­mo de bebidas alco­ólicas ou qualquer produto que cause dependência química, para me­nores de 18 anos, é crime. Na cidade, a lei é descumprida. O comércio e a população fazem vistas grossas a ela, e as autori­dades não fiscalizam.

bebidas

Nessa semana, o jornal A Hora, acompanhou os passos de dois jovens, um menino de 15 anos e uma menina de 17 anos, na busca pelos produtos. De nove estabelecimentos comerciais vi­sitados, só um solicitou a iden­tificação de um dos menores. Os demais venderam as drogas lícitas e indicaram marcas e teor alcoólico. Num bar questio­naram se ele gostaria de beber o produto no local.

Todas as conversas foram gra­vadas e encaminhadas ao Minis­tério Público para serem anexas a um processo criminal. A proi­bição está prevista no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Ado­lescente (ECA).

Conforme o promotor de Jus­tiça de Lajeado, Carlos Augus­to Fioriolli a pena varia de 2 a 4 anos de prisão. Estes podem ser substituídos por pagamen­to de fiança, de até 20 salários mínimos.

Em 2003, a lei, que era jul­gada como uma contravenção penal, teve alterações e hoje é um crime. Os proprietários dos estabelecimentos comer­ciais flagrados serão julgados pelo juízo comum, sem medi­das alternativas de pena.

Em casos de reincidência no cri­me a Justiça poderá solicitar à ad­ministração municipal que casse o alvará de licença do comércio.

As compras do menino de 15 anos

Terça-feira, dia 2, às 16h. O primeiro ponto escolhido para a tentativa da compra foi um posto de combustíveis no bairro Olarias, próximo de um campo de futebol.

O rapaz vai até o local e pede um maço de cigarros. Assusta­do, por nunca ter comprado um antes, apenas aponta para uma marca. A atendente olha para o rosto do menino, alcança o produto e diz “R$ 3,5”. Ela não solicita identificação e sequer questiona se aquele produto é para ele.

Passam-se 20 minutos. O pró­ximo local é um minimercado, no bairro Campestre. O local é pouco frequentado, e as bebidas ficam expostas na entrada do estabelecimento. Não há placas indicando a proibição da ven­da.

O jovem dirige-se a pratelei­ra, em que estão expostas as bebidas. Ele é atendido pelos proprietários. A mulher ques­tiona ao menino o que ele está procurando. E ele pergunta, “qual é a cachaça mais barata que tu tem?”. A mulher entrega o produto e o cobra.

Em seguida, o rapaz, de 15 anos, tenta comprar uma cerve­ja gelada em um minimercado, no bairro Santo André. A dona do local pega a bebida. Para por alguns instantes e, desconfiada, pergunta qual era a idade dele, se trouxe algum documento de identificação ou se está acom­panhado de algum responsável. O menino desiste da compra.

Em outro bar, na quadra abaixo, o garoto tenta comprar de novo a bebida. No estabeleci­mento os produtos ficam atrás do balcão e é o atendente quem alcança o produto. Ele paga R$ 4 por uma garrafa de cerveja ge­lada e sai do local sem qualquer questionamento.

Depois de 30 minutos, mais uma compra é efetivada em um bar, no bairro São Cristo­vão. Para instigar o vendedor, o rapaz, com uma lata de cer­veja em mãos, questiona se há o mesmo produto em garrafa e gelado. O garoto, mais uma vez, compra a bebida alcoólica sem dificuldades.

O que a garota de 17 anos comprou

Quinta-feira, dia 4, às 14h. A jovem de 17 anos começa as buscas por bebidas alcoólicas e comprova a fragilidade da fiscalização e execução da lei.

Em supermercado, no cen­tro, ela analisa qual bebida exposta nas prateleiras com­prará. Enquanto olha, uma promotora de vendas de vi­nho oferece uma prova da bebida para a adolescente. Ela recusa e a mulher insiste. Não há cartazes sinalizando a proibição da venda.

Em seguida, com uma gar­rafa de vodca ela passa pelo caixa com tranquilidade. A atendente olha para o rosto da garota. Não diz nada.

Minutos depois, em um posto de combustível, na av. Senador Alberto Pasqualini, no bairro Florestal ela entra no centro de conveniência e é observada pelos funcionários. No freezer, a jovem pega uma garrafa de cerveja, pergunta qual o valor e compra com fa­cilidade. Ignoram a idade.

Duas quadras do local, em um centro de distribuição de bebidas, a garota compra mais uma garrafa de vodca. Ao tentar pagar a bebida no caixa, o atendente questio­na a menina se ela a tomará logo, visto que estava quente. “Se quiser, tenho gelada.”

Fiscais admitem omissão

Em Lajeado, segundo representantes dos órgãos fis­calizadores, os estabelecimentos comerciais nunca foram fiscalizados quanto à venda de bebidas alcoólicas para menores de 18 anos.

O promotor Fioriolli; o comandante da Brigada Militar (BM), major Cesar Augusto Silva; e a coordenadora em Saúde de Lajeado, Lívia Mara Maciel, confirmam a falta de fiscalização dos órgãos.

O promotor admite que o Ministério Público (MP) de­veria observar mais a lei. O comandante da BM afirma que o órgão trabalha em conjunto com o município nes­tes casos, mas relata que quando tentaram organizar a primeira operação não tiveram apoio municipal por falta de funcionários.

O major conta que a BM atua mais no fim das festas e concilia o trabalho de coibir a venda com a de dirigir embriagado. “Autuamos, mas é o município quem tira o alvará.”

A coordenadora da Vigilância Sanitária diz que o ór­gão orienta o comércio. Segundo ela, não há registros de cassação de alvarás por venda de bebidas, porque nunca houve flagrante e nunca foi feita uma fiscalização.

Pela regra, para abrir um comércio com venda de bebidas alcoólicas é preciso ter um alvará de licença para funcionamento. Este só é concedido pela Vigilância Sanitária do município se estiver de acordo com as normas de saúde – uma delas com placas que indicam o decreto da lei e a proibição da venda de bebidas alcoólicas para menores de 18 anos. Na prática, há falhas.

“Os jovens se espelham nos pais”

Para o psiquiatra de Lajeado, José Katz no momento em que as crianças percebem que os pais são alcoólatras e bebem para esquecer os problemas, elas querem copiá-los. “A bebi­da se torna um esconderijo.”

Ele diz que houve um au­mento no número de jovens al­coólatras, em todas as classes sociais. Para Katz, a proibição da venda estimula o consumo. Segundo ele os jovens gostam de ter o que não podem.

Katz acredita que a solução seja a criação de estruturas que permitam que o adoles­cente tenha regras e formas de crescimento.

O psiquiatra lembra de uma normativa que proibiu a ven­da de bebidas alcoólicas pró­ximos a rodovia. Salienta que ela teve que ser logo modifica­da porque a venda do produto tem um giro econômico eleva­do, mostrando que a sociedade depende dele.

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