Lajeado -Detentos do regime fechado do Presídio Estadual de Lajeado encontram no artesanato uma forma de banir a ociosidade das 23 horas diárias que ficam dentro das celas. Os produtos, além de remitir a pena, rendem-lhe a sobrevivência da família que os aguarda. Em novembro, alcançarão mais uma conquista – expor os trabalhos artísticos em um estande exclusivo na Expovale.
Com 25 anos, um rapaz de Lajeado preso por tentativa de homicídio, passa o dia confeccionando artesanato. Ele aprendeu a primeira técnica com um companheiro de cela, e hoje desenvolve e ensina diversos tipos de trabalhos para os demais presos. Denominado plantão de cela, pelo seu bom comportamento e relacionamento com os outros detentos, o rapaz tenta incentivar a todos a utilizarem o tempo dentro da cadeia para elaborar novas técnicas de fazer arte. Com ele, mais 80 presos aderiram à ideia e segundo o jovem, mantêm o sustento de suas famílias exclusivamente com a venda dos produtos. As esposas levam os trabalhos para casa todas as semanas, quando visitam seus maridos na penitenciária. Parte do artesanato é vendida dentro da casa prisional para as visitas daqueles que não o produzem. “Deixamos exposto no corredor, as visitas passam, gostam e compram para ajudar”, diz. Assim como esse jovem os outros têm a mesma expectativa de que as habilidades com as artes lhes proporcionarão novas oportunidades, quando estiverem livres. “Se a gente não conseguir emprego, temos como sobreviver, fazendo artesanato”, acredita. Outros presos reforçam que querem mudar a visão que a sociedade tem deles. “Por um erro cometido, teremos que pagar a vida inteira”, critica um apenado.
O trabalho com o artesanato rende-lhes outro benefício, a remissão de pena. A compensação ocorre da seguinte forma: dos sete dias trabalhados, a penitenciária registra apenas três por semana, porque dois são os dias de visita, e sábados e domingos são considerados dias de folga. A soma mensal chega a 12 dias de trabalho. Como a lei penal prevê que a cada três dias de atividade o preso será compensado com um dia a menos de pena, os artesãos têm reduzidos quatro dias por mês de sua punição.
Cada peça produzida é comemorada por todos os colegas de cela. O presídio é dividido em duas galerias – A e B – e nelas existem 20 celas. Em todas há pelo menos um preso artesão. “É um trabalho que conseguimos fazer mesmo com a cela lotada. São mais de 18 homens dentro de um espaço de 12 metros quadrados”, calcula outro preso.
Novas metas
Com a vaga garantida na Expovale, os apenados têm outros dois objetivos: expor seus produtos em outras feiras na região e conseguir a carteirinha do artesão que é confeccionada na Casa do Artesão. Com ela, poderão deixar seus produtos à venda diariamente na entidade. Para isso, pedem ajuda da comunidade para arrecadar R$ 660, que custearão para 30 presos a taxa de inscrição de R$ 22 da carteirinha.
Material parao trabalho
Todo material utilizado para fabricação dos produtos é trazido pelas esposas e revistado na entrada da penitenciária. A administração também busca patrocinadores para aquisição de algumas matérias-primas, assim como o Conselho da Comunidade Carcerária que contribui com valores para a iniciativa. No entanto, conforme os presos, mesmo que o material seja simples, sempre há carência porque a cada semana novos detentos participam das atividades e o que tem se torna pouco. Entre os materiais que eles mais utilizam estão a cola de madeira e branca; linha de crochê; palitos de picolé; e meia de seda.
Estande naExpovale
Os presos exibirão seus artesanatos na Expovale – 12 a 21 de novembro – em um estande reservado pelo Associação Lajeadense Pró-Segurança Pública (Alsepro). Conforme o administrador substituto da penitenciária, Paulo Roberto Ribeiro, a organização será feita pelas assistentes sociais e a venda pelos presos do regime semi-aberto, ou então, pelas esposas dos apenados do regime fechado.
Saiba mais
A Expovale é o maior evento do Vale do Taquari e, por sua evolução constante, é uma das cinco principais realizações do estado. O evento ocorre de 12 a 21 de novembro, no Parque do Imigrante, em Lajeado. A estimativa é de que no mínimo 200 mil visitantes circulem pela multifeira e que ela gere 44 milhões em negócios entre os 420 expositores que estarão presentes.
O planejamento do artesanato
O estudo com o desenvolvimento dos objetos é tanto que um dos apenados há dias tenta dar movimento a uma caixa de joias feita de palito de picolé, fazendo com que se abra com apenas um toque. A mesma matéria-prima é usada para fazer luminárias, barcos e bichos, que com apoio de outros materiais adquirem formas. Para criar um avestruz esculpiram a cabeça e as pernas em madeira e o tronco com uma pinha. Para eles, qualquer material pode ser reaproveitado como base para uma nova peça.
Os presos fabricam ainda quadros esculpidos em madeira; móbiles; arranjos de flores com meia de seda; patinhos de origami; e há poucos dias aprenderam uma técnica de sacolas recicladas e impermeáveis. As sacolas feitas de jornal são eco sustentáveis e devem ser vendidas para lojas da cidade distribuírem aos seus clientes.