Entre a noite de segunda- feira, 4 de setembro, e a manhã de terça-feira, 5, as águas do Rio Taquari levaram 49 vidas e deixaram oito pessoas ainda desaparecidas. Um mês depois, a tragédia continua, e famílias ainda vivem entre a descrença e a esperança de encontrar algum familiar.
Como forma de marcar a data e respeitar o momento de tristeza que a região vive nos últimos 30 dias, a Praça Matriz de Muçum, uma das cidades mais atingidas pela cheia, recebe uma missa nesta terça-feira, 4, às 9h30min.
Além da celebração religiosa, também haverá entrega de sementes e mudas para as famílias de pequenos agricultores e o plantio de flores na cidade. A iniciativa é da Paróquia Nossa Senhora da Purifi cação.
Confusão e dúvidas
Na lista de desaparecidos, está Beatriz Pietta. A moradora de Muçum de 72 anos teve a casa totalmente coberta pelas águas do Taquari. O marido e o filho, Alvaro e Macximiliano, morreram na enchente.
Irmão de Beatriz, Valcenor Leopoldo Fleck, 74, mora no Paraná e veio ao Vale para tentar encontrar a família. “Foi uma situação triste, todo aquele sofrimento”, conta o irmão. Ele, a esposa e uma sobrinha foram até o Instituto Geral de Perícia (IGP) de Porto Alegre para reconhecer o corpo. Entre as burocracias enfrentadas, Fleck diz ter reconhecido o rosto e o cabelo da irmã. O IGP confirmou e entregou o atestado de óbito.
A família organizou o velório e o enterro no Cemitério de Muçum. Na semana seguinte, por meio de ligação, Fleck foi informado que o corpo da irmã havia sido retirado do cemitério para nova perícia e exame de DNA. “Ficou uma situação, além de constrangedora, difícil de acreditar”, reforça.
Beatriz voltou a integrar a lista dos desaparecidos. Desde então, Fleck não recebeu mais notícias do corpo e nem da irmã. “O lamento da família é a falta de resposta concreta e falta de laudo, porque foi feito apenas um telefonema”.
Fleck conta ter passado a infância em Muçum, sempre com medo das enchentes. A ideia, agora, é reconstruir a casa da irmã, para preservar a memória dela.
Em busca do recomeço
Após ter três casas arrancadas pela força da água, dois caminhões levados pela correnteza, maquinário agrícola danificado, além de vacas leiteiras e uma área de terra devastada pela enchente, a família de Janete Zilio, 57, calcula prejuízos que superam R$ 1 milhão e tenta retomar a vida, em Linha Alegre, comunidade de Muçum.
Mas a maior perda foi pessoal. Um mês após a tragédia, Janete quer encontrar o sogro, Deoclydes José Zilio, de 94 anos, que ainda está na lista de desaparecidos. “Sinto muita falta do ‘vô’, ele era uma pessoa maravilhosa. Só que- remos encontrá-lo”, desabafa.
O sustento da família vinha da agricultura. “Perdemos toda nossa plantação de tomates, parreiras, feijão, feijão vagem, brócolis, repolho, couve-flor, tudo era plantado por nós e revendido. Ainda não conseguimos retomar às atividades”. O prejuízo pode ser muito maior, detalha Janete.
Desde a tragédia, ela e o marido Raul estão morando na casa do irmão dela em uma comunidade próxima a atingida pela enchente. A ajuda que recebem é de cestas básicas e vestuário. Janete e o esposo já conseguiram refazer os documentos pessoais como CPF, RG e CNH, mas ainda aguardam verba por parte dos governos para reconstruir a moradia.
“Já entregamos nossos documentos no Sindicato Rural de Muçum, responsável pela assistência às famílias da zona rural e prometeram nos ajudar. A previsão para reconstruir nossa casa é janeiro do próximo ano”, conta. Entre as pessoas desaparecidas ainda estão moradores de Roca Sales, Lajeado, Arroio do Meio e Encantado.