Associados organizam protesto e ameaçam entrar na Justiça

CRISE NA COOPERATIVA

Associados organizam protesto e ameaçam entrar na Justiça

Grupo defende assembleia para decidir sobre venda de ativos e troca de diretoria na Languiru. Intenção também é buscar amparo jurídico para resguardar patrimônio da cooperativa e dos associados

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Atualizado terça-feira,
21 de Março de 2023 às 08:37

Associados organizam protesto e ameaçam entrar na Justiça
Associados reagem após anúncio do presidente da cooperativa com a intenção em vender frigoríficos para grupo chinês. Produtores defendem definição por meio de assembleia. Crédito: Reprodução/YouTube
Vale do Taquari
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A insatisfação de parte dos associados com a gestão na Languiru é motivo de protesto. O ato está previsto para hoje às 13h em frente ao Agrocenter, em Teutônia. Além disso, um grupo de produtores afirma que vai ingressar na Justiça para exigir que qualquer venda de ativos tenha de passar por uma assembleia extraordinária.

A mobilização ganhou força após o presidente da Languiru, Dirceu Bayer, revelar a possibilidade de vender frigoríficos de aves e suínos para um grupo chinês. O anúncio foi feito na sexta-feira, 17, durante reunião com associados. O encontro gerou frustração entre os produtores diante também da falta de respostas sobre o futuro da cooperativa.

No entendimento de parte dos associados, tanto a parceria com a Lactalis no segmento de laticínios quanto a venda de frigoríficos precisam do aval dos produtores. Há também o pedido pela troca da diretoria a qual atribuem má gestão. Diante do cenário, líderes regionais, prefeitos e representantes do setor produtivo monitoram o plano de reestruturação apresentado em dezembro. Sem ações efetivas, organização de agricultores aguardam posicionamento oficial do presidente da cooperativa.

Já a direção da Languiru, defende que a venda de unidades, a parceria com a Lactalis e o reposicionamento da marca são fundamentais para superar a crise. Nos anúncios oficiais, a cooperativa atribui a instabilidade ao prejuízo nos segmentos de suínos e aves, às altas nos custos de produção e os resultados abaixo do esperado após investimentos em modernização.

A crise também impacta os funcionários e prestadores de serviços. Há relatos do atraso no pagamento de comissões e do valor por quilômetro rodado. Em alguns casos, os funcionários estariam em casa na espera por novas orientações para voltar ao trabalho.

Liminar pelo direito de escolha

Pelo menos dez produtores assinaram pedido judicial para barrar eventual venda de unidades fabris. O processo deve ser protocolado ainda hoje. Os associados pedem uma assembleia extra para decidir também se o presidente Dirceu Bayer permanece no cargo. Essa reivindicação foi feita ainda na sexta-feira, mas não houve retorno por parte da diretoria.

De acordo com o advogado que representa o grupo de agricultores, Vilson Meyring, essa não é a primeira vez da qual busca na Justiça uma forma legal de intervir em decisões da diretoria. “Esse processo é diferente, pois enfatizamos os impactos sociais não apenas em Teutônia, mas várias outras cidades onde a Languiru atua. Esperamos sucesso no deferimento.”

Outra liminar deve ser protocolada por prefeitos da região. O objetivo é buscar informações sobre critérios de pagamentos dos credores pelo fato da cooperativa receber aporte com recursos públicos.

Mobilização de produtores

O ato hoje tem o objetivo de alertar a comunidade sobre as dificuldades na Languiru, esse é o entendimento do produtor rural Henrique Horst, de Imigrante. “Não é só aos associados, queremos mostrar a importância da cooperativa no seu aspecto econômico e social.”

Para Horst, associado desde 1988, é de direito dos produtores que formam a cooperativa decidir pelos rumos da marca. Segundo ele, é por meio de uma assembleia que a venda de ativos, troca de diretoria e ações de reestruturação devem ser conduzidas.

“Meu pai já sofreu muito quando a Coopave quebrou na década de 1980, tivemos de recorrer na Justiça para não perder o patrimônio conquistado com muito trabalho. Não queremos passar por isso de novo”, desabafa Horst. Horst, que também já integrou diretoria de sindicatos e foi vereador, diz faltar transparência por parte da diretoria.

Segundo o produtor, os problemas na Languiru se arrastam desde 2016. “Chama a atenção que em nenhum momento isso foi repassado ao associado e somente se falava em volumosos investimentos”, pontua Horst.

A mobilização hoje ainda conta com apoio do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias e Cooperativas da Alimentação (Stica). De acordo com o presidente Pedro Mallmann, há uma preocupação com o futuro dos trabalhadores a partir da parceria com a Lactalis ou venda de frigoríficos.

“É muito difícil a negociação com a empresa francesa. Não conseguimos fechar acordo salarial e o valor que eles ofereceram corresponde a 80% da inflação”, observa Mallmann. Segundo ele, a Languiru tentou transferir trabalhadores do laticínio para o segmento de aves, porém a adesão desse movimento foi baixa.

Insegurança nas propriedades

A parceria por cinco anos com a Lactalis deixa uma série de dúvidas aos produtores. Uma delas está atrelada à política de preços. De acordo com o produtor Tiago Horst, de Teutônia, a empresa multinacional não segue os mesmos critérios.

“A cooperativa conseguia manter melhores preços aos produtores em períodos de baixa de preço. No caso das grandes companhias do setor eles não têm a mesma preocupação e não se preocupam com nossos compromissos de investimentos”, exalta Horst.

Ele apoia a mobilização e defende maior transparência. Outros produtores que também temem o futuro da cooperativa preferem não se identificar por medo de represália. Conforme relatos, há referência de possível exclusão do quadro de associados.

Prefeitos esperam reunião

Os prefeitos da microrregião de Teutônia monitoram a situação da Languiru e afirmam aguarda reunião com o presidente Dirceu Bayer. O diálogo foi solicitado no mês passado, desmarcado e agora, sem data prevista.

Crise na Languiru foi revelada em dezembro. No mês seguinte, presidente da cooperativa anunciou série de ajustes para tentar contornar situação. Crédito: Arquivo/A Hora

De acordo com o prefeito de Teutônia, Celso Forneck, após conversa com a diretoria da cooperativa é que será tomada alguma decisão. “Pelo que percebemos até o momento não há impactos aos produtores. A nutrição animal está garantida e os pagamentos também.”

Deputado alerta para liquidação

A situação sobre as condições fiscais da Languiru repercute tanto no meio cooperativista, entre agricultores familiares, líderes empresariais, e também no parlamento gaúcho. É o que afirma o deputado estadual, Zé Nunes (PT). Engenheiro agrônomo por formação, integrante do sistema associativista na Região Sul do RS, relembra a importância da cooperativa de Teutônia para todo o segmento agroindustrial.

“A Languiru sempre foi uma referência. Pela sua história, pelo que construiu. Se transformou em uma marca reconhecida justamente por organizar a produção da agricultura familiar.”

Diante do quadro de crise no setor de proteína animal, considera ser necessário mais clareza na exposição dos números aos associados. “A situação é complicada para todo o segmento gaúcho. No entanto, houve um agravamento na Languiru.

Ao que parece, tem muito a ver com o modelo de gestão. O associado não pode ter dúvidas sobre a situação financeira. É dever da direção informar isso. O agricultor tem de ter esses números na mão.”

O parlamentar alerta para o plano de recuperação. Para ele, a venda dos frigoríficos e a transferência da bacia leiteira para uma multinacional precisa ser avalizado por assembleia. “Esse conjunto de decisões não me parecem estar em conformidade com a lei cooperativista”, critica Nunes.

Para ele, esse tipo de decisão precisa ser amplamente discutida com o quadro social. “A presidência precisa do respaldo da assembleia. Vender patrimônio e transferir produção é se afastar da finalidade da cooperativa. Essa não pode ser uma determinação centralizada.”

Na avaliação do deputado, a cooperativa está em um momento decisivo e a atitude dos associados ditará qual será o caminho a seguir. “Se os agricultores não reagirem, a Languiru vai se reduzir a quase nada. O que se está se desenhando, chamado de recuperação, na verdade é uma liquidação. Vai abrir mão do abate de suínos, de aves, já abriu do leite. O que vai ficar? Supermercado e posto de gasolina?”.

“Legislação das cooperativas precisa mudar”

O presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag/RS), Carlos Joel da Silva, lamenta a situação pela qual a Languiru enfrenta. Ele atribui esse cenário à falta de gestão e defende mudanças na legislação do cooperativismo. “Não há como intervir em uma gestão onde os associados escolheram os diretores e há um estatuto que rege a organização. Por isso, defendo mudanças na lei e até mesmo criar mecanismos para regular determinadas situações”, observa Silva.

]Ainda na tarde de ontem, presidentes dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (STRs) da região se reuniram para buscar alternativas que contribuam com a cooperativa. Entre as ações previstas está o diálogo com a diretoria sobre a real situação da Languiru.

MP monitora quadro

De acordo com o promotor de Justiça, Jair João Franz, não há nenhuma investigação instaurada contra a gestão da cooperativa. “O Ministério Público acompanha com preocupação o desenrolar dos acontecimentos envolvendo a Languiru, inclusive pelas informações que são vinculadas pela imprensa.”

Franz reforça ainda, que por se tratar de cooperativa é preciso seguir o estatuto. “Não pode haver ingerência do MP nesses estatutos e sim deve ser o resultado da participação dos associados em assembleia”, destaca o promotor em nota.

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