Servidores públicos do Judiciário devem retornar ao atendimento presencial. É o que determina resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ainda assim, associações e sindicatos da classe questionam a ordem e advertem para prejuízos à “rotina”.
Uma delas é a Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas). A organização solicitou ao CNJ a prorrogação do prazo. Para a entidade, a adaptação ao presencial precisa de mais tempo e também afirma ser necessário nomear novos magistrados, promotores de Justiça e defensores públicos.
O modelo de trabalho remoto no Judiciário do país foi implementado faz quase três anos. Na maior comarca do Tribunal de Justiça da região, em Lajeado, são seis magistrados e 60 servidores. Mais da metade está em teletrabalho. São cerca de 24 mil processos digitalizados e outros 800 ainda em arquivo físico.
Servidores afirmam que não há prejuízo para o atendimento à população. Inclusive foi criado uma central de atendimento, no térreo, em que o cidadão é orientado sobre andamento do processo, cronogramas e encaminhamentos. Já os magistrados mantém agenda presencial para as audiências. Com relação à necessidade de retorno dos servidores, o Fórum adverte que não foi comunicado de maneira oficial pelo Tribunal de Justiça do RS.
Conforme o TJ-RS, as providências para adequação das normativas estão em fase final. Para tanto, foi instituído Grupo de Trabalho específico com a finalidade de elaborar minuta de Ato Conjunto (Presidência e Corregedoria-Geral da Justiça). A previsão é de que o documento seja publicado nos próximos dias.
Na decisão para o retorno à presencialidade, em novembro do ano passado, o relator, conselheiro Luiz Philippe de Melo Filho, ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), afirmou que “o retorno da magistratura aos seus respectivos locais de trabalho é imperativo inegociável neste momento em que toda a sociedade brasileira já voltou à situação de normalidade”.
A Associação de Juízes do RS (Ajuris) avalia como aspectos a produtividade do Judiciário e o acesso da população à Justiça. De acordo com o presidente, Cláudio Martinewski, no período da pandemia e no pós-pandemia não houve prejuízo para o trabalho jurisdicional e para o andamento dos processos com trabalho no formato virtual, nem aumento de custos. “A produtividade da magistratura gaúcha se manteve”, afirma. Para ele, é importante também considerar, a questão de acesso à Justiça dos mais carentes, pois na maioria necessitam do modelo presencial para encaminhar as questões.
Presença nas audiências
A advogada Sabrina Schneider atua no direito tributário e trabalhista. Na primeira, como se trata de atribuição federal, não há audiências. Com isso, a presencialidade é menos exigida. Na área do trabalho é diferente. “Houve ocasião em que as partes se prepararam, levaram advogados, testemunhas e a única pessoa que estava remoto era o juiz”, lembra e complementa: “isso mancha a imagem da Justiça perante a população. Estavam todos lá, e o mais importante não.”
Por outro lado, nas audiências de conciliação, acredita que por meio de videochamada houve aspectos positivos. “Tirou o constrangimento e se facilitou o diálogo. O que interferiu em mais acordos e menos litígio.” O advogado Luis Fernando Cardoso de Siqueira tem uma análise semelhante. Para ele a presença do servidor e do magistrado é importante, mas depende de cada caso.
“Na Justiça do Trabalho, área em que atuo, considerando que 100% dos processos são eletrônicos e podem ser acessados via remota, bem como que o atendimento remoto funciona de forma eficaz, a ausência física de parte dos servidores na sede não causa grandes prejuízos. Todavia, para fins de audiências é muito importante a presença do magistrado na condução dos trabalhos.”
Busca por equilíbrio
Maria Luiza Pinheiro Pimentel foi estagiária no Poder Judiciário e hoje é advogada. “Vivenciei as práticas antes da pandemia e até agora. Quanto ao trabalho dos advogados, entendo que há uma maior dificuldade de contato com os servidores, em especial quando é uma decisão que deve ser analisada e cumprida com urgência. Assim, é necessário ligar para o Fórum, muitas vezes não há com quem conversar ou é difícil esse contato.
Para ela, a determinação do CNJ de limitar em 30% o número de servidores em teletrabalho é essencial. “Hoje há uma central no Fórum que faz o primeiro atendimento do advogado. Antes era direcionado para a Vara competente, por exemplo, Vara de Família. Ali se conversava com o servidor diretamente. Para alguns assuntos, essa decisão mais dificulta do que auxilia.”
“Justiça distante”
O presidente da subseção de Lajeado da OAB, Ronaldo Eckhardt, defende um Judiciário mais presente na comunidade. “A sociedade vê a Justiça distante. As pessoas sentem isso”, realça.
De acordo com ele, até advogados relatam algumas dificuldades. O horário de funcionamento, das 12h às 19h, é um dos exemplos citados por ele. “Tem que abrir integral, manhã e tarde”, destaca. Para Eckhardt, é necessário também que os magistrados residam no município da comarca, para haver mais sintonia com a população e, assim, conhecer as particularidades daquele local.
Sobre o período de restrições impostas pela pandemia, o presidente da OAB Lajeado avalia que houve uma série de medidas para readequar o trabalho. Isso ocasionou um represamento dos processos. “Os juízes têm tentado aumentar as pautas de audiências. Mas hoje os processos estão mais lentos do que antes da pandemia.”