Por muitas décadas, o Brasil foi considerado referência na cobertura vacinal do público infantil. Campanhas nacionais com adesões maciças da população, por exemplo, resultaram na erradicação de algumas doenças, como a poliomielite e o sarampo. Porém, nos últimos anos, os índices de imunização caíram significativamente e colocam o país em alerta.
Os motivos que levaram à queda nos níveis e os riscos que isso acarreta às crianças foram abordados em “Nossos Filhos”, programa multiplataforma do Grupo A Hora na última quinta-feira, 1º. O médico infectologista Guilherme Campos e a coordenadora da Vigilância Epidemiológica de Lajeado, Juliana Demarchi, foram os convidados.
O recomendável no país é que entre 90% e 95% das crianças estejam imunizadas na maior parte das doenças. Juliana lembra que o plano nacional de imunização foi estabelecido na década de 1970 no país e que as vacinas, há décadas, sempre se mostraram eficazes. “O grande medo que se tem, pela baixa cobertura, é que esses vírus voltem a circular”, salienta.
A servidora entende que um dos motivos que levou à baixa cobertura vacinal é que os pais não vivenciaram o auge destas doenças. “Eles não lembram de surtos com mortes de sarampo, não testemunharam a poliomielite, a difteria. Muitas dessas doenças foram eliminadas de circulação, mas ainda existem”.
Desinformação
Em 2016, o Brasil recebeu o certificado de eliminação do sarampo, após registrar mais de 177 mil casos de 1990 a 2000. No entanto, ao não conseguir controlar um surto iniciado em 2018, por conta da baixa cobertura, o país perdeu este reconhecimento. Campos ressalta que boa parte dos casos foram importados do exterior, em viagens no período de férias escolares.
Campos comenta também que a desinformação e as “fake news” minaram a confiança da população nas vacinas. “É um período extremamente atípico. A vacina da HPV, por exemplo, previne da infecção e do próprio câncer de colo de útero. A gente tem uma nova arma contra algo que as pessoas tanto temem”, salienta.
Para Juliana, é necessário um trabalho permanente e contínuo para evitar a disseminação de notícias falsas sobre as vacinas. “Precisamos qualificar as informações que buscamos, filtrar e verificar se essa fonte é confiável”.
Outros tempos
Em outros tempos, vacinas como a da gripe registravam procura maciça da população, a ponto das doses se esgotarem em poucos dias. Introduzida no calendário vacinal em 1999, também registra queda na cobertura nos últimos anos.
“Lembro que, em outros anos, a vacina chegava e, em uma semana não se tinha mais. As pessoas queriam colocar seus nomes na lista de espera. Hoje, sobram. No ano passado, utilizamos os estoques até dezembro, e este ano, será da mesma forma. A cobertura vacinal média contra a influenza está entre 50% e 60%, índice muitos baixos”, salienta Juliana.
Em virtude da pandemia, a procura em 2020 esteve acima da média dos últimos anos, em virtude que ainda não havia a vacina contra a covid-19 e também pouco se sabia sobre a doença. Porém, 2015 foi o último ano em que se atingiu uma cobertura satisfatória dentro do público infantil.
Quanto à covid, a cobertura vacinal entre crianças virou um tema polêmico, inclusive entre os médicos. Campos defende a imunização. “Começou porque as crianças não estavam morrendo e questionavam da necessidade de vaciná-las. Mas estamos falando de uma pandemia, de controle de uma doença. A criança transmite a doença. E sem o controle populacional, começamos a ficar em ondas”.