Luta contra a pólio: mais de 400 crianças não foram vacinadas no Vale

SAÚDE

Luta contra a pólio: mais de 400 crianças não foram vacinadas no Vale

Região atingiu 89,41% da cobertura vacinal no ano passado. Diante da crescente preocupação com o risco de volta da paralisia infantil no país, organizações e autoridades de saúde buscam estratégias para incentivar a imunização

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Luta contra a pólio: mais de 400 crianças não foram vacinadas no Vale
Morador de Lajeado, Paulo Renato Johann, hoje com 73 anos, teve a infecção quando criança e, ainda hoje, lida com as consequências da doença (Foto: Bibiana Faleiro)
Lajeado
Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Na mão direita, Paulo Renato Johann, 73, carrega uma bengala. Aos 3 anos, depois de uma infecção de poliomielite, o morador de Lajeado perdeu alguns movimentos das pernas e, sete décadas depois, ainda lida com as consequências da paralisia infantil.

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Na década de 50, quando era criança, não havia informações sobre a doença, e as vacinas só vieram mais tarde. Por isso, hoje, diante da preocupação nacional em função da baixa cobertura vacinal contra o vírus no Brasil, ele reforça a importância de se imunizar.

Paulo Renato era um menino saudável, o mais forte entre os irmãos. Mas, depois da infecção, teve que reaprender a caminhar. Entre tratamentos, idas à Porto Alegre e os cuidados da família, frequentou a escola e fez amigos.

Ele lembra que o educandário ficava a cerca de 2km da casa dos pais, e sempre tinha ajuda para fazer o trajeto. “Os amigos mais fortes me levavam na garupa. Uma vez foi num carrinho de mão”, recorda.

Perto dos 20 anos, já com um curso técnico em contabilidade, prestou concurso público para a prefeitura de Lajeado. De 1971 a 2007, foi funcionário do município, tendo atuado na Secretaria da Fazenda e na contabilidade. Hoje, Paulo Renato é casado e tem um filho.

Alerta mundial

O primeiro surto de poliomielite noticiado no Brasil foi em 1911, no Rio de Janeiro. As vacinas surgiram mais tarde, em 1955 e 1960. Um ano depois, a primeira imunização em massa começou e, em 1994, o Brasil recebeu o certificado de erradicação da doença.

Hoje, no entanto, ela volta a preocupar. Depois de 28 anos, com a baixa procura pela vacinação, o Brasil está na lista dos oito países da América Latina com alto risco de volta da infecção, devido à baixa cobertura vacinal.

No país, pelo menos 500 mil crianças não receberam o imunizante. A cobertura vacinal que já chegou a 95% no território brasileiro, hoje, registra um dos números mais baixos da história: 67%. Desde 2015, o país não consegue mais atingir a meta de 95% do público-alvo vacinado, número ideal para que a população seja considerada protegida.

Bolívia, Equador, Guatemala, Haiti, Paraguai, Suriname e Venezuela são os outros sete países em risco, segundo dados da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). Há alguns anos, a poliomielite ressurgiu em Israel e, no último dia 17, autoridades sanitárias do Malawi notificaram o primeiro caso selvagem de pólio na África em mais de cinco anos.

No Vale

Este cenário também coloca os municípios do Vale do Taquari em alerta. Conforme dados da Secretaria Estadual de Saúde, em 2021, a região atingiu cobertura vacinal de 89,41%, o que corresponde a 3930 crianças com a primeira dose na idade indicada: dois meses de vida. Nos 38 municípios do Vale, 467 não foram vacinadas.

Conforme a Secretaria Estadual de Saúde, 18 municípios alcançaram ou passaram a meta. As outras cidades atingiram entre 41,38%, como Progresso, e 98,8%, em Teutônia. A Secretaria de Saúde de Progresso, no entanto, contesta a informação e afirma que todas as crianças do município estão vacinadas.

Coordenadora da Vigilância Epidemiológica de Lajeado, Juliana Demarchi, destaca que desde o início das campanhas contra a doença, apenas no ano passado a meta não foi atingida no município. A cobertura vacinal chegou a 85,23% no período.

As principais causas da diminuição da procura pelo imunizante se devem ao descaso e à desinformação. Uma pesquisa da Secretaria da Saúde, em 2019, mostrou que 59% das pessoas que não levaram seus filhos para vacinar apontaram motivos como esquecimento, medo de efeitos colaterais e falta de tempo.

Vida de quem tem paralisia

De acordo com a médica infectologista Cristiane Pimentel Hernandes, a poliomielite é uma doença infecciosa aguda que atinge os neurônios da medula espinhal e do tronco cerebral. Ela é transmitida pela via fecal-oral ou por secreções eliminadas pela boca das pessoas infectadas.

As consequências variam desde uma fraqueza aguda associada a dores articulares até meningite e, em casos mais graves, os pacientes podem evoluir para doença paralítica, insuficiência respiratória e óbito.

“A vida de quem tem paralisia infantil é bastante desafiadora, com dificuldades no dia a dia. As pessoas acometidas pela doença podem apresentar paralisia de uma das pernas, dos músculos da fala e da deglutição – não conseguindo se comunicar e se alimentar de forma adequada”, ressalta a profissional.

Além disso, podem apresentar dificuldade para urinar, atrofia muscular e osteoporose, com a necessidade do uso de cadeira de rodas.

A vacinação é a única forma de prevenção e todas as crianças menores de cinco anos devem ser vacinadas. O imunizante é oferecido durante todo o ano nos postos de saúde, e é indicado para crianças menores de 1 ano de idade em três doses: a primeira aos 2 meses, seguida de outras duas, aos 4 e 6 meses, todas elas injetáveis. A proteção é completada com dois reforços da vacina oral, aos 15 meses e aos 4 anos.

Campanhas

O Rotary Internacional é a organização que financia as vacinas da poliomielite no mundo, e a maior bandeira da entidade é a erradicação do vírus. Ativo na comunidade, o Rotary Club de Arroio do Meio promove a Campanha das “Latinhas da Pólio”, distribuídas no comércio da cidade para arrecadar doações para este fim. Em outubro do ano passado, o clube também organizou a Pedalada contra a Pólio.

De acordo com a presidente eleita para a gestão 2022/2023 do clube, Juliana Gasparotto, este ano, a entidade já prepara novas ações de combate à doença.

Em Lajeado, o município também projeta a intensificação da vacinação, a partir de 4 de junho. Assim, todo primeiro sábado do mês, o Posto de Saúde do Centro estará aberto das 8h às 14h para a vacinação de rotina.


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