“Nada do que for feito vai trazer minha filha de volta”

Boate Kiss

“Nada do que for feito vai trazer minha filha de volta”

Desabafo da moradora de Paverama, Diana Tischer, mãe de vítima de uma das maiores tragédias do RS, resume o sentimento na espera por justiça. Julgamento dos quatro réus inicia hoje e deve se estender por duas semanas

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Atualizado quarta-feira,
01 de Dezembro de 2021 às 09:53

“Nada do que for feito vai trazer minha filha de volta”
Fernanda Tischer (foto) cursava Medicina Veterinária na UFSM. Natural de Paverama, é uma das 242 vítimas do incêndio na boate Kiss. Mãe lembra da dedicação da jovem na área em que pretendia seguir carreira. (Foto: Felipe Neitzke)
Estado
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Após quase nove anos da tragédia na boate Kiss, em Santa Maria, familiares e sobreviventes ainda esperam por justiça. Moradora de Paverama, Diana Tischer, 53, é mãe de uma das vítimas e convive com o sentimento de indignação e dor da saudade.

A jovem Fernanda morreu aos 21 anos enquanto tentava sair da boate. Ela era aluna do curso de Medicina Veterinária na UFSM. Laudos da perícia confirmaram que todas as mortes foram causadas por asfixia pela inalação dos gases tóxicos.

O julgamento dos quatro réus inicia hoje e busca punir aqueles que são indicados como os responsáveis pela tragédia. Já a mãe de Fernanda, não cria expectativas sobre a decisão da Justiça. “Nada do que for feito vai trazer minha filha de volta”, diz. Ela também parou de acompanhar o processo e a evolução do caso. “Quanto mais pesquiso e busco respostas, pior é”, comenta.

Diana aponta uma série de erros e que, segundo ela, poderiam ter sido evitados. Na sua avaliação, houve falhas em relação a fiscalização do local e imprudência no uso do artefato pirotécnico. Espera que situações como esta não se repitam.

Sobre o dia da tragédia, descreve um cenário de guerra. Após receber a informação do incêndio, ligou para o celular de Fernanda. Alguém desconhecido atendeu e falou que a jovem estava entre as vítimas.

“O que se via eram pessoas sentadas chorando e famílias desesperadas. Muitos caminhões do Exército para recolher os corpos. Eu mesmo não consegui fazer o reconhecimento no IML. Meu cunhado é que confirmou”, lembra.

Para conviver com a perda, busca apoio em livros. “A leitura me fez compreender algumas coisas. Vim de um período de luto pela morte do meu marido, que morreu em um acidente. Seis anos depois aconteceu essa tragédia na Kiss”, conta Diana.

Hoje, ela mora com a filha Thais, 23 e o genro que estão à frente da propriedade leiteira. Diana repassou a administração do local. “Me imaginava na velhice ainda na ordenha das vacas e com o trabalho no campo. Agora penso um dia de cada vez”, relata.

Etapas do julgamento

O Poder Judiciário inicia hoje um dos mais complexos e emblemáticos julgamentos da sua história. Vão a júri os quatro acusados pela tragédia na Boate Kiss. Os réus Elisandro Sphor e Mauro Hoffmann (sócios da casa noturna) e Marcelo dos Santos e Luciano Leão (integrantes da banda) são acusados de 242 homicídios e 363 tentativas, com dolo eventual, quando se assume o risco de matar.

Orlando Faccini Netto é o responsável pelo julgamento que começa às 9h, no Tribunal de Justiça em Porto Alegre. O Conselho de Sentença será formado pelo magistrado e sete jurados escolhidos por sorteio nesta manhã. Durante o júri popular serão ouvidas 19 testemunhas, sendo cinco indicadas pelo Ministério Público e 14 pelas defesas. Também serão ouvidos 14 sobreviventes.

Depois do depoimento dos sobreviventes e testemunhas, haverá o interrogatório dos réus, que podem optar pelo silêncio. A previsão é que os trabalhos sejam divididos em três turnos, com uma hora de intervalo para almoço/janta e pausa para descanso dos jurados. Esse é um aspecto definido pelo magistrado em consonância com as partes. Não haverá interrupção no fim de semana.

A expectativa é que o julgamento dure duas semanas. Neste período, os jurados estarão isolados e sem comunicação. Eles ficam hospedados em hotéis e acompanhados em tempo integral por oficiais de Justiça. Em razão dos protocolos de prevenção à pandemia, serão liberados 124 lugares na plateia do plenário.

Cerca de 200 servidores atuam na organização do júri. Além do reforço no efetivo de agentes de segurança do judiciário e das equipes de vigilância privada, contratadas que já atuam junto ao Foro, haverá o apoio da Brigada Militar também no entorno dos hotéis que serão disponibilizados para os jurados e as testemunhas.

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