“Não acreditamos em monocultura”

Negócios Em Pauta

“Não acreditamos em monocultura”

Micael Eckert é sócio da Vivente, vinícola com sede em Colinas reconhecida internacionalmente por seus vinhos vivos

Por

“Não acreditamos em monocultura”
Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

A localidade de Linha Ano Bom Alto, em Colinas, abriga a produção de vinhos que fazem parte do cardápio dos restaurantes mais conceituados do Brasil e até do exterior. Com uma proposta inovadora, a Vivente Vinhos Vivos nasceu pelas mãos de três amigos apaixonados pelo processo de O estrelense Micael Eckert é um dos fundadores da empresa, junto com Diego Cartier e Rafael Rodrigues. No início dos anos 2000, Eckert e Rodrigues fundaram a cervejaria Coruja, marca consagrada no mercado de artesanais, vendida em 2015. Dois anos depois, eles se juntaram a Cartier para fundar a Vivente.

– De onde surge a vocação para empreender no ramo de bebidas?
Micael Eckert – Sou natural de Estrela e quando era criança algo que me marcou era a fábrica da Polar. Ficava no Centro, perto dos prédios públicos, por isso sempre passávamos por ela e sentíamos aquele aroma no ar. Uma das pessoa mais importante da cidade na época era o cervejeiro da Polar. Meu pai e meu avô tinham um apreço muito grande pela fábrica, assim como todos na em estrela, pois era uma cidade com 20 mil habitantes e uma empresa com mil funcionários. Meu avô, que também fazia cerveja, era dono de um posto de gasolina. Minha mãe era professora e lecionava em Teutônia, então eu ficava com o meu avô. Assim, vivenciei o lado empreendedor da família.

– Como foi a tua formação até começar o negócio?
Eckert – Estudei no Colégio Martin Luther e depois cursei Arquitetura na Ufrgs. Desde criança eu ajudava meu avô a fazer cerveja, sem beber, obviamente. Continuei ajudando ele na adolescência e, antes de fazer faculdade, tinha o desejo de ser cervejeiro. Conversei com pessoas do ramo e queria fazer um curso na cidade de Vassouras. Mas minha mãe vetou, porque não queria que eu fizesse carreira com bebida alcoólica. Continuei fazendo cerveja durante a faculdade. Fazia no apartamento, com os maltes disponíveis na época, e levava para os encontros e festas da faculdade. No meu projeto final, idealizei uma escola técnica de cerveja e por isso visitei várias cervejarias. Naquela época conhecei meu sócio da Coruja, o Rafael, que também é arquiteto, mas formado em outra universidade. Me formei no ano 2000 e trabalhava em um escritório quando o Rafael me perguntou sobre produzir a minha cerveja profissionalmente. A partir daí começamos a montar o plano de viabilidade.

– Quando o negócio começou e quais foram os desafios?
Eckert – Começamos em setembro de 2004. Buscamos um design diferente e um cuidado para não ter competição com as grandes cervejarias. No início foi difícil entrar nos restaurantes, porque tinham resistência a uma bebida mais turva, mas a partir do momento que bebiam, viam que tinha algo novo, com sabor muito diferente e agradável, assim como o aroma. Ela também estourava como champanhe, o que chamava atenção no bar. O som foi muito importante para nós, pois usávamos todos os sentidos. Nossa linguagem gráfica foi bem estudada, provocativa e ligada a arte. Temos muitos amigos formadores de opinião e do meio artístico O que nos levou ao slogan da Coruja: beba com sabedoria. Assim começamos. Fomos a primeira embalagem de 500 ml feita no Brasil, a primeira com tampinha própria. Sempre cuidamos para sermos diferentes e com qualidade.

– Como foi a decisão de vender a marca e iniciar a Vivente?
Eckert – Fabricávamos em Teutônia, na Gol Bier, e fomos para uma cervejaria em Santa Catarina. Foi um grande passo, tivemos outras condições de trabalho lá, uma fábrica muito mais moderna, a questão comercial ficou muito mais desenvolvida. Atingimos o mercado de São Paulo e a Coruja se tornou um grande negócio. Estávamos em uma cervejaria terceirizada e houve uma pressão para que aceitássemos outros sócios no nosso negócio. Acabamos vendendo parte da empresa, deixando de ser majoritários. Com isso perdemos muito do comando e a nossa saída foi natural. Saímos em 2015 e começamos a pensar em outros projetos. Montamos a AVR (Águas Vão Rolar), pela qual trazemos nossas ideias e espírito para outras bebidas. A primeira parceria foi a OvniH , que resultou no primeiro espumante em lata do Brasil. Em paralelo, fizemos uma bebida em parceria com a Dado Bier, a Hop Soda, feita de chá, lúpulo e fruta, sem álcool. A Vivente vem junto com essas ideias.

– Porque a decisão de trabalhar com vinhos vivos?
Eckert – A Coruja já era uma cerveja viva, onde a maturação prossegue na garrafa, com uma fermentação lenta e gradual. O Diego é um grande amigo que conhecemos porque ele gostava muito da Coruja e trabalhava com cervejas raras e especiais. Também é músico, e em vários momentos falávamos de trabalhar juntos. O Diego é um grande entusiasta dos vinhos naturais e em 2017 fizemos uma brasagem teste com um amigo nosso. O vinho vivo tem uma coisa de deixar ele acontecer, deixar a natureza se expressar, com menos intervenção possível. O produto em si é diferente. Fazemos vinhos naturais, com fermentação espontânea. Usamos somente um ambiente acondicionado no frio para manter a fruta bom estado. Vemos esse mercado de vinho natural crescendo verticalmente. Tem pessoas legais fazendo muita coisa bacana. É um espírito diferente, de cada um deixar o produto evoluir com suas leveduras e seus cuidados.

– Porque a decisão de instalar a vinícola em Colinas?
Eckert – Sempre gostei de agricultura e a cerveja que é um negócio urbano, enquanto o vinho tem uma pegada mais rural, mais da natureza. Também queria ficar perto da minha família e a ideia era investir em alguma área. Comecei a procurar um lugar com boa condição para a Uva e surgiu Colinas. Estamos a 500 metros de altitude, mesma condição de Garibaldi. O solo tem menos argila, o que é bom. Algumas coisas na vida fazemos pelo coração e a propriedade é encantadora. Estamos plantando vinhas resistentes, testando outras coisas, como mirtilo, framboesa e amora. Não acreditamos em monocultura, por isso plantamos erva mate em torno de todo o terreno. Queremos fazer uma agrofloresta estamos correndo para fazer bastante coisa legal.

– De que formar a vivente alcançou notoriedade rápido. Como isso aconteceu?
Eckert – A Vivente carrega muito do carinho de todos os sócios desde o início. Conseguimos ter produtos bons, logo fomos legalizados, então conseguimos atender bons restaurantes com toda a parte legal correta. Temos uma garrafa transparente, gravada com design mais limpo e as pessoas gostam disso. Hoje temos pedido de exportação para Europa, EUA, Canadá, mas nossa produção é um tanto quanto pequena. A Vivente tem esse caráter de inovação que a Coruja teve lá atrás, de ser mais informal e um pouco provocativo. Nada além de uvas e leveduras selvagens. É uma pegada nova que tem conquistado muitas pessoas. Em 2019 o Rafa acabou saindo, porque ele tem família em Florianópolis e era difícil ficar aqui. Ele montou a Vôo Líquido em Santa Catarina e ainda somos sócio na AVR.

– Qual a diferença entre trabalhar com cerveja ou vinho?
Ecker – A cerveja se faz a qualquer momento, pois o cereal pode ser mantido em silos e o lúpulo é refrigerado. A Uva não tem isso, depende de uma safra e de uma época do ano onde você que produz. Normalmente não vende logo e tem um guarda longa. Então o capital imobilizado é maior. Você compra a garrafa antes, a barrica, as uvas e está tudo pago quando começa a venda. É preciso mais investimento. A cerveja fica pronta de 20 a 40 dias e é um produto de consumo mais rápido, então ela dá um retorno mais rápido e o giro mais constante. O vinho é por ano, por safra, por isso é mais difícil.

Acompanhe
nossas
redes sociais