“Tenho muita gratidão por estar bem e viva”

OUTUBRO ROSA

“Tenho muita gratidão por estar bem e viva”

Entenda como manter a autoestima elevada e a positividade podem ajudar a amenizar os desafios de viver com câncer de mama

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Atualizado segunda-feira,
05 de Outubro de 2020 às 14:20

“Tenho muita gratidão por estar bem e viva”
Foto: Amanda Cantú
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Na busca por investigar um nódulo em uma das mamas, a auxiliar administrativa Vânia Fanti, 51, recebeu o diagnóstico de câncer. Era janeiro de 2016. “A notícia de que se tem um câncer é diferente para cada um. Não é fácil, e até você aceitar, é complicado. Ninguém espera que isso vai acontecer”.

O tratamento iniciou logo após o diagnóstico. No ano seguinte, veio a cirurgia de retirada total da mama direita, a quimioterapia e a radioterapia. Em 2018, apareceram metástases ósseas e a medicação aumentou, sem previsão de parar. Porém, nenhum destes desafios foi o suficiente para tirar o sorriso do rosto de Vânia.

“Tento me manter positiva. Não deixo de chorar quando tenho vontade, mas busco manter o alto-astral e o pensamento positivo, porque vou superar tudo o que tiver que encarrar”.

O tratamento hoje consiste em quimioterapia intravenosa, além de medicação oral. Para Vânia, os cuidados já viraram rotina. “Têm alguns efeitos colaterais, pois a quantidade de medicação é bem grande. Mas aprendi a conviver”. Moradora da localidade de Tamanduá, em Marques de Souza, ela tem na família e na natureza os pilares para se manter motivada.

“O amor da minha família e amigos me dá força e tento dar isso de retorno a eles, então, se me perguntam como estou bem, respondo que estou super bem”.

Apesar das dificuldades de viver com câncer, Vânia destaca os hábitos positivos que aderiu desde o diagnóstico, como alimentação mais saudável e a prática de exercícios físicos.

 

Sobre a autoestima, ela também dá um show de positividade. Quando os cabelos caíram em função do tratamento, por exemplo, Vânia se reinventou em meio ao verão, recorda. “Nunca fui muito de sair com lenço. Até gostei de não ter cabelo porque não sentia calor”, brinca. Desde que o cabelo voltou, não cortou mais, para que ele pudesse crescer ao natural.

“Tenho muita gratidão por estar bem e viva. É difícil dizer para alguém ter motivação, pois cada um enfrenta de uma forma, mas sempre me motivo porque ninguém fará isso por mim”, destaca. “O que o câncer trouxe de ruim, quero esquecer. Mas o que trouxe de bom, que foram várias coisas, só tenho a agradecer”.

 

Faça o que você ama

Ao receber o diagnóstico de câncer de mama é inevitável que transformações na rotina aconteçam, tanto na vida das pacientes quanto no dia a dia da família. De repente, tudo passa a girar em torno de exames, consultas, cirurgias, tratamentos e seus efeitos colaterais.

Mas quando há uma rede de apoio e amor, encarar o desafio fica mais fácil, como explica a médica oncologista do Centro Regional de Oncologia (CRON), Camila Jeremias. “Você ainda pode viver muitos momentos inesquecíveis! Existirão dias ruins e existirão tantas pessoas quanto forem necessárias para que você passe por eles”.

De acordo com Camila, o câncer de mama é o câncer mais comum entre as mulheres. No Brasil, estima-se que, em 2020, cerca de 66 mil novos casos da doença sejam registrados. “Ela não tem uma causa única. Vários fatores podem contribuir para seu desenvolvimento”, destaca a oncologista. De modo geral, o câncer “é resultado de modificações no DNA das células, que favorecem uma proliferação celular anormal e a formação de tumores”.

A maioria dos cânceres de mama se desenvolvem por causas esporádicas, isto é, hábitos que as pessoas adotam ao longo da vida. A médica oncologista explica que a adoção de hábitos de vida saudáveis pode reduzir o risco de câncer de mama em até 30%.

Além disso, manter a autoestima elevada ajuda a amenizar os desafios da doença. Camila afirma que é importante não esconder os sentimentos, nem mesmo ter vergonha de pedir ajuda, quando necessário. Buscar atividades prazerosas é uma ótima alternativa para encarar os dias ruins.

Seja conversar com o melhor amigo, preparar uma comida gostosa, ouvir uma música ou ler, o importante é escrever um novo capítulo da vida. “Lembre-se que ter dias ruins não é sinônimo de fraqueza, significa que somos humanos e também nos fragilizamos”.

 

Positividade para vencer

A psicóloga Cristiane Pivatto, especialista em Psicologia Hospitalar, membro do corpo clínico e professora da Residência Multidisciplinar em Atendimento ao Paciente Oncológico do Hospital Bruno Born, fala sobre como manter a positividade e a autoestima em dia durante a batalha contra o câncer de mama.

A HORA – Passar por um tratamento contra o câncer é muito difícil, tanto de forma física, como emocional. Como manter a positividade neste momento?

Cristiane – O tratamento oncológico tende a mobilizar as pessoas acometidas pelo câncer pelo estigma negativo que ainda carrega. A ideia socialmente construída, seja pelo histórico dos tratamentos realizados no passado, pelas experiências pessoais vivenciadas na própria família ou a partir de informações da mídia de que são tratamentos potencialmente difíceis, podem causar impacto emocional nas pessoas ao adoecerem.

Quando há uma percepção negativa da doença e do tratamento, a tendência é isso resultar em maiores dificuldades no manejo da situação, o que configura em um quadro emocional de baixa autoestima, insegurança, angústia, medo, ansiedade e comportamentos negativos. Para manter uma estratégia saudável de comportamento para o enfrentamento da doença e tratamento, é importante compreender que é legítimo passar por uma fase de luto, que consiste em sentimentos de tristeza, raiva, ansiedade, medo, incerteza, entre outros.

É um período de assimilação e elaboração das perdas reais e simbólicas. Também, confiar em si próprio, na família e na equipe; conversar com os profissionais sobre suas dúvidas e receios; compreender que o tratamento faz parte da vida, mas que ela vai além do tratamento, que existem outras situações que estão acontecendo na vida e são boas. Desenvolver a espiritualidade também pode ser uma grande aliada, bem como evitar a autocobrança, respeitar-se e cultivar o amor-próprio.

 

Como cuidar da autoestima neste momento tão difícil?

A autoestima costuma baixar devido fragilidade interna. As mudanças de vida, rotina e imagem corporal tendem a potencializar alguns sentimentos de menos-valia por um determinado período, normalmente, na fase de transição de uma etapa para outra. É preciso tempo para assimilar o que está acontecendo, encontrar outras possibilidades e perceber o que é possível resgatar, aprender e validar para a sua vida.

Algumas dicas que podem ajudar são não comparar-se a outras pessoas ou outros pacientes; construir um ciclo construtivo, respeitando seu tempo e processo; compreender que a doença é apenas uma fase da vida; fazer planos e escolhas saudáveis, como ler um livro, fazer uma caminhada, ter uma boa conversa, passar um batom, dançar, rezar ou meditar.

 

Muitas mulheres precisam fazer a retirada da mama e, como consequência do tratamento, perdem os cabelos. Como trabalhar a autoestima diante destas situações?

A cirurgia de retirada total da mama tem um impacto na autoestima da mulher. A mama representa aspectos da feminilidade e sexualidade, é um elemento importante na autoestima, tem simbolismo afetivo. A perda do cabelo também está diretamente ligada ao feminino.

Compreender que a perda do cabelo, por exemplo, afetou a minha autoestima e, por isso, estou com uma visão negativa e pessimista sobre mim, é importante. Este pensamento, muito provavelmente, impactará o psicológico. Quando tenho consciência de que forma está afetando, tenho o que fazer para melhorar. Se um mundo interno (a parte psicológica) está “atrapalhada”, há um sofrimento psíquico, ela deve ser olhada, amparada e ressignificada. O tratamento psicológico poderá auxiliar neste período.

Para trabalhar a autoestima das mulheres, costumo instigar com elas o que podem ganhar com as mudanças. Reflito com elas sobre a situação real da doença, explico que a curto prazo não temos como mudar o que está acontecendo (efeitos do tratamento), mas podemos ampliar o repertório.

De forma prática, existem recursos externos como uso de lenços, perucas, chapéus ou tocas para a perda do cabelo. As próteses de silicone (acessório para colocar no sutiã) e cirurgia de reconstrução da mama também são possibilidades.

De forma subjetiva, trabalho por meio da escuta psicológica a reconfiguração dos recursos internos, transcender o olhar, amadurecer e identificar outras possibilidades saudáveis, de forma a reconfigurar o amor-próprio; perceber as virtudes; reconhecer as limitações; analisar o que é possível mudar e o que não é; fazer pequenos movimentos de mudança; dar e receber carinhos e trabalhar o autorrespeito, a autocompaixão e o autoconhecimento

 

No caso das mulheres que colocam prótese de mama, como lidar com este processo de adaptação/aceitação da prótese?
Colocar uma prótese mamária é uma escolha pessoal e também perpassada pela indicação médica. A aceitação da prótese do ponto de vista psicológico, pode estar associada diretamente ao desejo de colocá-la. Algumas mulheres querem reconstruir a mama, outras entendem que não. É perpassado pela subjetividade.

Portanto, o que vai impactar na sua vida, qual a disponibilidade interna de submeter-se a cirurgia, os significados e o momento de vida de cada uma delas é particular. Os fatores culturais, sociais, financeiros, psicológicos influenciam na escolha. A idade e o apoio familiar também corroboram. Cada caso é um caso. Na minha prática de atendimentos, percebo que as pacientes que elaboraram a doença/tratamento e desejam a reconstrução da mama vivenciam de forma saudável e adaptativa esta fase.

 

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