A fiscalização do corpo alheio

Opinião

Amanda Cantú

Amanda Cantú

Jornalista

Colunista do caderno Você

A fiscalização do corpo alheio

Por

Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Se você costuma acompanhar este espaço, deve se lembrar que a objetificação dos corpos femininos já foi pauta por aqui. Também já conversamos sobre os micromachismos. Pois bem, o tema da nossa conversa hoje se relaciona com estes dois assuntos.

Na última semana, esbarrei em uma publicação no Instagram cujo título era o mesmo desta coluna, a fiscalização do corpo alheio. A dona da postagem trazia como exemplo um post da blogueira Camila Monteiro, onde esta compartilhava vários comentários feitos por terceiros em fotos onde mostrava seu corpo. Comentários gordofóbicos e cruéis.

Logo me lembrei do caso da cantora Adele, que no início do ano apareceu alguns quilos mais magra. Logo virou notícia pela quantidade de pessoas bombardeando suas fotos com comentários “preocupados com a saúde dela”. Depois me lembrei da atriz brasileira Cleo que, até pouco tempo atrás, sofria o mesmo ataque, mas no sentido oposto. Os tais fiscais decidiram deixar bem claro que achavam que ela estava engordando demais.

Essa realidade é algo já comum – infelizmente – na vida de mulheres que atuam na mídia. Mas pare para refletir um pouco. Você, mulher, também já não passou por isso, mesmo não sendo famosa?

A fiscalização do corpo alheio é um tipo de microviolência naturalizada, com consequências devastadoras. Basta uma rápida pesquisa no Google sobre transtornos alimentares e o crescente número de adeptos a procedimentos estéticos agressivos para compreender a magnitude disso.

A reprodução desta prática misógina e machista está diretamente associada à objetificação dos nossos corpos, quando deixamos de sermos vistas como seres humanos e somos reduzidas a um objeto à serviço da aceitação do outro. A manipulação é tamanha que, mesmo não concordando, passamos a impor a nós mesmas a necessidade de nos encaixarmos nos padrões estabelecidos. Digo isso com propriedade, porque eu mesma o faço.

O mais revoltante em todo este processo é a incapacidade de empatia e bom senso dos tais fiscais do corpo alheio. Por que alguém se julga no direito de fazer um comentário cruel a respeito do corpo de outra pessoa? A hipocrisia da desculpa “preocupação com a saúde” não é argumento, uma vez que, dar apoio a alguém não tem relação alguma com impor pressão e julgamento à pessoa.

Não temos o direito de sermos complacentes e omissos ao presenciar tais situações, mas também precisamos estar muito atentos para não reproduzir um padrão já tão enraizado na nossa cultura. Precisamos refletir sobre nossas palavras e ações. Não sabemos o que se esconde por trás de uma foto, por trás da história de cada um, e nada nos dá o direito de impor o que pensamos ao outros.

Não deveríamos precisar nos encaixar em expectativas alheias para sermos valorizadas.

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