Tributação e inspiração

Opinião

Ney Arruda Filho

Ney Arruda Filho

Advogado

Coluna com foco na essência humana, tratando de temas desafiadores, aliada à visão jurídica

Tributação e inspiração

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A tributação é necessária. Sem o dinheiro dos tributos, os governos não conseguiriam fazer frente às necessidades antes inimagináveis, que neste ano surgiram com a pandemia do coronavírus. Reforços na assistência à saúde, medidas de proteção ao emprego e à renda, obrigaram nações de todo o planeta a botar a mão nos cofres. Até quem não tem cofre teve que cavocar dinheiro pra enfrentar o tal inimigo invisível e desconhecido. Outro dia, falando de reforma tributária, o professor Isaías Coelho afirmou que a criação um imposto sobre grandes fortunas é uma ideia “sem inspiração”. Para o catedrático de Direito da Fundação Getúlio Vargas, que tem auxiliado o Ministro Paulo Guedes na formulação da reforma, essa modalidade de tributação tem sido erradicada em diversos países.

Inspiração é necessária. Sem inspiração, não teríamos casas, ruas, praças, cidades. Talvez não tivéssemos, remédios, hospitais. Certamente não teríamos gente pra se dedicar aos ofícios e profissões. Definitivamente não teríamos livros, música, rádio, cinema, televisão. Outro dia, num rasgo de inspiração, o mesmo Ministro propôs instituir a cobrança de um tributo de 12% sobre livros, ainda que a Constituição Federal proíba (art. 150, inciso VI, alínea “d”).

Indo direto ao ponto, não é preciso inspiração nem genialidade pra perceber que o mercado editorial de livros impressos tem sofrido com a concorrência das mídias digitais. Aliado à falta de incentivo à leitura, o trabalho de muitas editoras, especialmente das pequenas, de autores, artistas gráficos, ilustradores, de livrarias e de toda a cadeia produtiva seria afetado com o aumento do preço final dos livros. Além disso, iria diminuir ainda mais o acesso à cultura e à educação em um país com tantas desigualdades como o nosso. Em nota, a União Brasileira de Escritores afirmou que “aumentar o preço dos livros é trancar as portas da oportunidade, em que o povo brasileiro pode alcançar uma vida digna por meio do estudo e da educação de qualidade. É o caminho do subdesenvolvimento”.

Fico pensando o quão impactante para o caixa do governo será taxar livros e papel de jornal. Fico pensando em qual “fonte de inspiração” leva um economista a concluir que tributar livros é mais adequado que tributar grandes fortunas. Como afirma a advogada Raquel Xavier Vieira Braga, os livros são tesouros que contam histórias, ensinam comportamentos, educam as pessoas, revelam segredos, confidenciam sentimentos, relatam acontecimentos, compartilham descobrimentos e avanços científicos, questionam pensamentos e dogmas, rompem barreiras no mundo das ideias, quebram paradigmas. As grandes fortunas são tesouros que servem apenas aos seus senhores, assim como o fazem alguns dos altos gestores da nossa economia. Pra finalizar, faço minhas as palavras de Monteiro Lobato: “um país se faz com homens e livros”.

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