O Ministério Público (MP) oferece denúncia por homicídio culposo contra um servidor da Secretaria de Obras e Serviços Públicos (Seosp). Para a promotoria criminal, ele “deu causa ao evento letal”. O funcionário público era o responsável designado para a manutenção da energia elétrica do Parque dos Dick, em fevereiro de 2017, quando Sidinei Borges do Amaral morreu eletrocutado em uma quadra de areia.
A denúncia do promotor de Justiça Ederson Luciano Maia Vieira foi encaminhada ontem à Justiça Criminal. Na íntegra do documento, o representante do MP cita que “o denunciado, deixando de observar regra técnica de profissão, e agindo de forma negligente, matou Sidinei”.
O homem foi vítima de parada cardíaca decorrente de eletroplessão. Era dia 22 de fevereiro de 2017. O morador de Guaporé participava de uma partida de futebol na cancha de areia do parque, e sofreu uma descarga elétrica ao tocar um dos postes de metal instalados no entorno. O evento Curta o Verão foi organizado pelo Sesc com apoio do governo de Lajeado.
Na denúncia, o promotor confirma que o denunciado era o encarregado da manutenção da rede elétrica do parque. Ele compareceu ao local no dia 20 de fevereiro de 2017, “ciente do evento que lá ocorreria e de prévios reclames de frequentadores quanto a choques elétricos junto à cerca e postes de sustentação dos refletores”.
Mesmo assim, sustenta o MP, “de forma negligente, limitou-se a examinar os reatores de energia para lâmpadas de alta pressão de vapor de sódio e refletores que não estavam funcionando, substituiu quatro dos cinco reatores e refletores instalados no poste de metal condutor do choque elétrico até a vítima, deixando de examinar e trocar o quinto, mesmo que de fácil visualização, que se apresentava sem a tampa e em mau estado de conservação”.

NO A HORA: A Hora acompanha o caso. Em janeiro deste ano, família da vítima, que mora em Guaporé, entrou na Justiça para cobrar R$ 600 mil em indenizações. Naquele momento, o governo já estava custeando uma pensão de R$ 1,4 mil mensais aos familiares
Desvio de função
Durante a investigação, o promotor verificou também o desvio de função do denunciado. Em 1991, foi nomeado para o cargo de “contramestre de telefonia”. Entretanto, e segundo o próprio servidor, sempre teria atuado como eletricista da prefeitura. “Ele admitiu nunca ter feito curso de formação ou de atualização na área”, diz Vieira. “Algo grave, se tratando de eletricidade em espaço público.”
Sobre isso, o promotor pretende averiguar todos os anos de atuação do servidor para descobrir possível responsabilidade por parte de secretários e ex-secretários municipais, e também de ex-gestores e atuais. Em 1991, o responsável pela pasta de Obras era Aleixo Lauro Gisch, que também já foi ouvido. “A intenção é descobrir quem mudou a função dele.”
O promotor reforça a gravidade do fato. “A precária instalação e o mau estado de conservação do reator foram determinantes para o aquecimento anormal dos condutores de ligação e derretimento do revestimento plástico de um deles, o que deu causa ao curto-circuito, o qual conduziu a corrente elétrica fatal para o parafuso de fixação e após para o poste de ferro que sustentava o conjunto de refletores e cerca no entorno”, cita.
Sobre eventual responsabilidade do atual prefeito, Marcelo Caumo, o promotor é cauteloso. “É preciso mais elementos para uma responsabilidade penal. Uma comprovação de que ele sabia. E me parece difícil que o gestor tenha conhecimento de todos esses detalhes. Ainda mais este, que pelo que tudo indica, passou despercebido por muitos. Inclusive o então secretário de Obras, à época só há 21 dias no cargo, teria dificuldade para saber.”
Hoje, o servidor permanece na Seosp, mas em outra função. Conforme o site da prefeitura, ele está lotado como operador especializado. Já o cargo original, de contramestre de telefonia, foi extinto recentemente pelo Executivo.
Ex-secretário denunciado
Na denúncia, o ex-secretário de Obras, Cassiano Jung, foi denunciado por fraude processual. O servidor também é acusado do mesmo crime. Conforme o MP, no dia 23 de fevereiro de 2017, no começo da manhã, Jung e o servidor “inovaram artificiosamente, com o fim de produzir efeito em processo penal ainda não iniciado, o estado do reator que deu causa ao sinistro”.
Para o promotor, o ex-secretário teria ordenado que o servidor fosse até o local verificar a mediação do poste, cortar os fios de energia elétrica e retirar o reator em curto-circuito. “Mexeram na principal prova”, resume Vieira. No processo, ele afirma que “a retirada e alteração do estado das coisas dificultou a ação pericial porque impediu conhecer a forma como estaria ligado o reator ao circuito dos refletores”.
Questionado sobre a denúncia, Jung demonstra tranquilidade e garante que não pediu a retirada do reator. “Eu apenas pedi para que desligasse a energia do parque. Logo após, o delegado me ligou e comentou da necessidade de perícia. Liguei para o servidor e pedi para que ele acompanhasse a perícia. Foi quando ele me informou que já havia levado o reator”, garante.
Rodrigo Martini: rodrigomartini@jornalahora.inf.br