A reforma trabalhista vai enfraquecer financeiramente os sindicatos. Isso é um fato consolidado e admitido pelos principais sindicalistas da região. Diante do impacto nos valores recebidos anualmente dos trabalhadores, as entidades projetam novos modelos de atendimento e serviços para angariar associados e evitar a própria extinção.
É o caso, por exemplo, do Sindicato dos Empregados no Comércio de Lajeado, ou Sindicomerciários. Com as mudanças impostas pela reforma aplicada pelo governo federal de Michel Temer, a entidade prevê uma queda superior a 30% na arrecadação anual. Além da principal cidade da região, eles representam trabalhadores em Estrela, Arroio do Meio, Cruzeiro do Sul, Muçum, Progresso, Pouso Novo e Boqueirão do Leão.
“Estávamos recebendo uma média de R$ 200 mil a até R$ 250 mil por ano com o imposto sindical. O valor já foi mais alto. Em 2010, por exemplo, com o pleno emprego, chegamos a receber mais de R$ 300 mil”, estima o presidente deste sindicato, Marco Daniel Rockenbach.
Tal valor era custeado por aproximadamente seis mil comerciários, por meio do repasse anual de valor referente a um dia de trabalho. Na média, cada um pagava em torno de R$ 40 por ano para o sindicato, de forma compulsório. Ou seja, eram obrigadas a custear a infraestrutura da entidade representativa.
Desse repasse, diz Rockenbach, 60% ficava com os sindicatos. “Do total recebido a cada ano, 15% ia para as federações, 10% para as confederações, 5% para a central sindical e outros 10% para a Conta Especial Emprego e Salário, administrada pelo Ministério do Trabalho. Ou seja, muitos ganhavam, mas parecia que era tudo para a nossa entidade”, alerta.
Como forma de se adequar ao futuro novo quadro financeiro, o sindicato pretende aplicar uma série de medidas econômicas nos materiais e serviços prestados. Entre as ações, pretende diminuir o tamanho do folhetim trimestral publicado faz anos, e que agora deverá ser quase todo digital. “Vamos ter que nos adequar em muitos aspectos para não perdermos nossa força de representatividade”, diz.
Promoções para atrair associados
Diante do provável quadro financeiro negativo, explica Rockenbach, anunciado ainda em novembro do ano passado, após a entrada em vigor da reforma trabalhista, o Sindicomérciários já iniciou uma campanha para angariar mais associados. Naquele mês, eram pouco mais de 1,5 mil. Hoje, segundo o presidente, o número supera 2,5 mil sócios.
“Estamos todos os dias encaminhando novos pedidos para que os comerciários se associem. Não tem outro jeito, precisamos nos reinventar. E precisamos mostrar a nossa importância para cada um dos trabalhadores que optarem pelos nossos serviços”, ressalta.
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Segundo Rockenbach, antes da reforma, a taxa cobrada dos associados era de R$ 37 por mês. Agora, a entidade baixou o valor para R$ 21 mensais. Entre os benefícios disponibilizados, consultas médicas, odontológicas – 1,4 mil em 2017 –, convênio com Hospital Bruno Born – com 90 médicos conveniados e 30 especialidades.
Além disto, o associado do Sindicomerciários possui direito a consultas subsidiadas com outros profissionais médicos em áreas como fisioterapia, nutricionista, dermatologia, psicologia, pediatria, entre outros, e exames de mamografia, tomografia e ecografias. “Só em 2017 proporcionamos mais de 3,4 mil consultas médicas aqui na nossa sede e dentro do HBB.”
“Recuperamos mais de R$ 600 mil”
Ainda de acordo com o presidente, o trabalho realizado pelo sindicato nas homologações de comerciários demitidos resultou na recuperação – em valores pagos pelas empresas a menor durante as rescisões trabalhistas – de R$ 600 mil. “Só no ano passado homologamos cerca de 2,3 mil demissões. Dessas, 50% apresentaram algum valor a menor. Muitas vezes, por erro das empresas.”
Segundo Rockenbach, muitos empresários procuram o sindicato após a reforma para dar “segurança” aos processos de rescisões. “O pessoal do Recursos Humanos costuma só se preocupar com horas extras, folgas. Situações corriqueiras. E acabam esquecendo de uma série de obrigações Nós auxiliamos e já mostramos valores pagos a mais, gerando economia para as empresas.”
Salário próximo de R$ 5 mil
Hoje, Rockenbach trabalha apenas para o sindicato. É assim desde o início da década de 90. Antes, o atual presidente do Sindicomerciários atuava efetivamente como comerciário na antiga Lojas Hexsel S/A, cuja galeria ainda se encontra no mesmo local, na Rua Júlio de Castilhos. “É lá que estou lotado. Mas entrei para a entidade naquela época e, desde então, recebo o mesmo salário que recebia na empresa. Foi sendo corrigido e hoje é pago pelo sindicato. Está em torno de R$ 5 mil.”
Conforme ele, não existe um valor determinado no estatuto para o salário do presidente. Outros diretores, por exemplo, não recebem qualquer remuneração, porém seguem atuando na iniciativa privada. “Isso também depende do sindicato. Alguns pagam salários para os presidentes, e outros não. E tem outros, como o dos Bancários, por exemplo, que os próprios bancos custeiam o valor.”
Para o vice-presidente do Sindicomerciários, Ricardo Ewald, esta realidade vem mudando e, com a reforma trabalhista entrando em vigor, muitos bancos, por exemplo, devem extinguir tal pagamento. “Já há exemplos de instituições bancárias que cediam quatro ou cinco funcionários para o sindicato e, após novembro do ano passado, baixaram para apenas um. Isso veio com essa onda da Direita.”
Rockenbach e Ewald se revezam faz anos na presidência da entidade. O mesmo ocorre com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Alimentação (Stial), Adão Gossmann, que assumiu em 1993 e, desde então, só não foi presidente durante a gestão de 2002 a 2005. A reportagem tentou, sem sucesso, contato telefônico com ele.
Mais de 50 sindicatos no Vale
Com 38 municípios, o Vale do Taquari possui mais de 50 sindicatos registrados nessas cidades. A maior concentração está em Lajeado, onde existem pelo menos 15 entidades. Entre essas, representantes das classes dos trabalhadores em hotéis, bares e restaurantes; do comércio varejista; dos contabilistas; trabalhadores rurais; dos professores e servidores municipais; representantes comerciais; entre outros.
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Na região, quase todos os municípios – grandes e pequenos – possuem Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (STR). Há, também, sindicatos unificados, como o Sindicato das Indústrias da Construção Civil, Mobiliária, Marcenarias, Olarias e Cerâmicas para a Construção, Artefatos e Produtos de Cimento e Concreto Pré-Misturado do Vale do Taquari, o Sinduscon. E também núcleos de outras entidades, como o Sinpro, em Lajeado, e o Cpers, em Estrela.
Entrevista
“Sem imposto obrigatório, o associativismo funciona melhor”
Entrevista com Giraldo Sandri, presidente do SindiLojas
A Hora – Você é contra ou a favor o fim do imposto sindical obrigatório?
Sandri – Eu sempre me posicionei contrário ao pagamento obrigatório por parte dos trabalhadores. É preciso fazer disto uma contribuição facultativa. O trabalhador tem que ser livre para escolher. Quem quiser participar, participa. Quem não quer, não precisa. E isso deve valer, também, para os sindicatos dos empregados e patronais. Já falei isso, também, para as nossas federações representativas.
O que muda, na sua opinião, com um imposto facultativo?
Sandri – A primeira coisa é a diminuição da renda, do lucro destes sindicatos que recebem valores compulsórios. Com isso, creio que, restarão apenas as entidades que, de fato, são importantes e relevantes para os trabalhadores. Da forma como está, virou emprego. Tem gente aí que se perpetua faz 10, 20 anos na presidência dos sindicatos porque lá é uma fonte de renda. Eu pergunto: será que haverá o mesmo interesse de muitos em se manter na direção e fazer tanto barulho se não houver valores envolvidos?
Para você, a falta de sucessão em alguns sindicatos locais é prejudicial?
Sandri – Com certeza. Sou contra reeleição. Não só para sindicatos, como para a maioria dos cargos públicos eletivos. Ou então que se decida por, no máximo, uma só reeleição. Isso para evitar, principalmente, casos que percebemos aqui mesmo em Lajeado e região, de pessoas que ficam eternamente nestes cargos. A luta acaba sendo de interesses próprios, ou partidários. E o associativismo funciona melhor quando é livre disto tudo.
Rodrigo Martini: rodrigomartini@jornalahora.inf.br