Não perturbe

Opinião

Raquel Winter

Raquel Winter

Professora e consultora executiva

Não perturbe

Por

Acordei devagar. Abri um olho de cada vez para acostumar com a claridade que invadia o quarto porque esqueci as cortinas abertas. Permaneci esparramada na enorme cama branca aguardando o momento certo de me espreguiçar. O momento chegou.
Lavando o meu rosto, senti fome e fiquei intimamente feliz quando lembrei do café da manhã que me aguardava. Adoro cafés da manhã de hotel e, apesar de geralmente servir-me da mesma coisa e que se resume a um pão com manteiga e café, me agrada saber que haverá muitas possibilidades à minha escolha.
Se eu estiver triste, posso abusar do mel, dos queijos e sucos. Se eu estiver alegre, os cereais e frutas recebem sua oportunidade. Com pressa? Um pão de queijo basta. Enfim, gosto de ter as possibilidades ao meu alcance. Outro ponto alto dos hotéis são aqueles pequenos cartazes onde consta uma frase direta, curta e esclarecedora que diz: não perturbe. Simples assim. Os cartazes ficam disponíveis para usarmos quando e se quisermos. Basta pendurar o bendito na maçaneta e feito, você terá sossego, sem que ninguém fique magoado, chateado ou mesmo curioso em relação àquela sua ausência momentânea. Privacidade sem rodeios, sem maiores explicações.
Bom demais e por isso mesmo eu fiquei pensando em como eu poderia adotar esse recado em outros momentos da minha vida. Admito que a primeira etapa, que é me permitir dizer não para as pessoas ou situações perturbadoras, quando essas, é claro, estiverem sob o meu controle, eu já aprendi. Agora, o desafio está em encontrar o meio de dizer não sem que a pessoa receptora leve para o lado pessoal e fique intrigada ou chateada. Sem que a culpa me assombre.
Talvez a chave dessa questão seja a resposta de outra pergunta: por que a camareira do hotel não se importa? Imagino que é porque esse fato está previamente acordado entre as partes. Em outras palavras, ela está preparada para receber um “não perturbe” sem se sentir afetada, porque compreende que temos lá nossos motivos para desejar um tempo a sós, sem que nada esteja relacionado com ela.
A camareira não fica desconfiada, perguntando-se o porquê não queremos a sua presença naquele momento, pensando o que ela fez de errado ou qualquer outra fantasia desnecessária. Ela sabe que existe essa possibilidade e apenas acata o recado, deixando o tempo passar até que um dia verifica que a porta está outra vez liberada para que ela entre e faça o que precisa ser feito. Sem traumas, sem ressentimentos.
O segredo está na transparência, no acordo prévio, no mútuo entendimento das regras. Pois então, me dê licença, que lá vou eu iniciar a redação dos contratos que me permitirão utilizar os cartazes de “não perturbe” sem causar estranhamento.

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