Painelistas propõem fórum permanente

Vale do Taquari - EDUCAÇÃO E ENSINO: para onde vamos?

Painelistas propõem fórum permanente

Necessidade de criar um novo modelo de ensino foi evidenciada em mais uma edição do Pensar o Vale. Cinco debatedores participaram do encontro promovido pelo A Hora na manhã de ontem. Foram abordados temas como valorização e qualificação do professor, violência em sala de aula e transformação da educação a partir do avanço tecnológico. Para os participantes, a mudança só será possível com discussões contínuas tendo a participação de toda a sociedade.

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Painelistas propõem fórum permanente
Vale do Taquari
Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

A Escola Estrela da Manhã sediou o evento em um momento emblemático, durante mais uma greve dos professores do Estado. Diante de mais um parcelamento em salários que não alcançam sequer o piso nacional, educadores gaúchos cruzam os braços evidenciando o descaso para com os profissionais.

Diretor de Conteúdo do A Hora, Fernando Weiss iniciou o debate questionando sobre as perspectivas da profissão. “Como assegurar o interesse na carreira do magistério diante desse cenário?”

Coordenadora do programa de Pós-graduação em Ensino da Univates, Ieda Giongo afirma que essa pergunta é permanente nas discussões e pesquisas da área, e deve permear os apontamentos pelos próximos anos.

Ex-professora das redes estadual, municipal e privada, destaca projeto realizado pela universidade que reúne professores, pesquisadores e alunos da educação básica para pensar novas formas de pensar a escola. “O professor deve ser um produtor de conhecimento, não apenas um reprodutor do que falam livros e as universidades.”

Para ela, o educador precisa se tornar um pesquisador de sua própria prática, e a sala de aula deve ser um local de pesquisa, não apenas teórica, mas também prática. “Com isso vamos fazer com que o professor vire um pesquisador da própria prática.”

Conforme Ieda, a região já experimenta experiências positivas nesse sentido, mas ainda existe pouca divulgação. “A despeito de todas as crises, temos professores muito bons e excelentes práticas pedagógicas que precisam aparecer mais.”

Para a coordenadora da 3ª CRE, Greicy Weschenfelder, a valorização salarial é um dos fatores imprescindíveis, e também um dos principais entraves. Lembra que o piso nacional da categoria, criado em 2008, em nenhum momento foi implementado na rede estadual.

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“Nesse momento, me sensibilizo com todos os professores que enfrentam faz tempo essas dificuldades”, alega. Greicy citou pesquisa realizada em 2013 pela Fundação Carlos Chaga. Entre 21 países pesquisados, o Brasil ficou em penúltimo lugar em termos de valorização dos professores.

Segundo ela, não é só o RS que está com dificuldades para honrar os vencimentos do magistério. Em 2015, afirma, seis estados parcelaram ou deixaram de pagar salários, número que dobrou no ano passado.

“Nosso sentimento é de tristeza e frustração com o parcelamento e a greve”, ressalta. Segundo ela, é preciso repensar o Estado, avaliando quais patrimônios podem ser vendidos para que se retome a capacidade de honrar com a folha de pagamento.

Secretário de Educação de Estrela e presidente da Asmevat, Marcelo Mallmann destaca a importância de os gestores apresentarem um plano de carreira atrativo, não apenas sob o ponto de vista salarial. “É saber que você vai entrar, sair, se aposentar.”

Lembra que o Plano Nacional de Educação obrigava a realização dos debates sobre o tema até o ano passado. “Por lei, os gestores precisam criar um novo Plano de Carreira até 2018, doa a quem doer”, alerta. No caso do RS, a carreira do magistério segue plano criado em 1970.

Retrato da sociedade

Para Mallmann, a formação inicial dos profissionais precisa ser aprimorada diante das mudanças velozes da sociedade. Segundo ele, o aluno de dez anos atrás é muito diferente do atual, algo que seria impensável em meados do século passado.

“Hoje ninguém sabe como serão as profissões amanhã e o desafio é conseguir entender esse momento”, aponta. Conforme Mallmann, hoje a educação está sendo pautada pela sociedade, quando deveria ser a indutora das mudanças sociais.

“A violência é um problema da sociedade, não da escola, mas é reproduzida no ambiente escolar”, exemplifica. Para a coordenadora da 3ª CRE, vivemos uma erosão da moral sem precedentes, onde impera a intolerância e fazer o certo parece estar errado.

Conforme Greicy, neste ano, foram registrados 58 casos de agressãoa professores nas escolas do Vale do Taquari. Lembra que, diante do crescimento dos casos de violência nas escolas, o governo gaúcho criou o programa Cipave, que visa promover a cultura de paz usando as linguagem dos jovens e envolvendo toda a comunidade escolar.

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Para ela, a questão da violência escolar deve ser enfrentada por todos independente de ser da rede pública ou particular. “A prevalência dos problemas é maior na rede pública, porque na privada a pessoa é convidada a se retirar, algo que não ocorre nas escolas públicas.”

Diretor do Colégio Sinodal Gustavo Adolfo, Edson Wiethölter afirma que a realidade entre as redes não é tão diferente. Segundo ele, na escola onde é gestor, os problemas ocorrem mais com os pais do que com os alunos.

“Nos últimos tempos, estamos indo para as delegacias e promotorias, coisa que não ocorria cinco anos atrás”, enfatiza. Para Wiethölder, o Estado precisaria respaldar as escolas contra as ações violentas. Cita como exemplo os assaltos que ocorrem nos educandários, sem punição para os autores quando esses são identificados.

Promotor da Infância e Juventude, Sérgio Diefenbach ressaltou o trabalho de formação realizado pelos círculos de justiça restaurativa. No próximo mês, somente em Lajeado serão formados 150 professores voltados para o trabalho de resolução de conflitos.

“Estamos investindo nisso como comunidade, pois não podemos apenas pedir paz. A dúvida é como se faz isso”, ressalta. O promotor lembra que a violência e as agressões nas escolas ocorrem em qualquer país do mundo e já ocorriam em outros tempos. A diferença, aponta, está na massificação da divulgação.

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“A briga que vejo no Whatsapp é igual a de 40 anos atrás. A diferença é que não era filmado”, alega. Segundo ele, em alguns aspectos, a intensidade da violência tem aumentado, mas não apenas nas escolas, e sim em toda a sociedade.

Diante desse fenômeno social, sugere empoderar o professor com novas ferramentas, em um momento da história em que a hierarquia e a disciplina com a qual ele foi formado não existem mais. “Hoje, o educador não detém o monopólio do conhecimento e ainda perdeu a força autoritária de expulsar.”

Para o diretor do Gustavo Adolfo, hoje os alunos não aceitam mais as imposições. Afirma que a sociedade contemporânea é argumentativa e todos opinam sobre tudo. “Antes de ir ao médico, já fiz meu diagnóstico na internet, por exemplo.”

Afirma que não existe instituição que funciona com qualidade sem disciplina, mas que essa deve ser determinada por especialistas e chancelada por um consenso. Para ele, o principal fator que impede a evolução da sociedade é a falta de discussão.

Direito universal

Sérgio Diefenbach se disse incomodado pela ausência de agentes políticos e empresários nas discussões sobre a educação. Para ele, essa diferença reflete muito do que acontece na atualidade.

“Cheguei a pensar que só proibindo a existência das escolas privadas faremos as classes alta e média pensar, de fato, na educação do país”, reflete. Segundo ele, é somente por meio do ensino que se decide a vida da nossa população.

“Falam em primeiro produzir riqueza para depois mudar, mas é impossível gerar qualquer mudança sem um povo educado”, aponta. Segundo o promotor, ainda falta a sociedade como um todo compreender a educação enquanto prioridade.

[bloco 4]

Conforme Diefenbach, o jurídico se aproxima do sistema educacional justamente para incentivar essa reflexão. De acordo com ele, as coisas se modificam no momento em que a sociedade compreende que a educação é um direito fundamental do brasileiro, expresso na Constituição.

“Boa parte dos nossos professores se formou em uma época em que a educação era um direito de alguns setores e famílias da sociedade, enquanto outras tantas não tinham esse direito.”

Para Diefenbach, vivemos o momento de transição desse entendimento, que ainda não está totalmente implementado. Prova disso são as cerca de 200 ações judiciais de famílias em busca de vagas para a Educação Infantil. “Temos que entender essa saída da exclusão para a inclusão.”

Tecnologia e formação humana

Tema constante nas discussões sobre o sistema de ensino, o avanço da tecnologia e a mudança causada por ela nas relações em sala de aula também foi debatido. De acordo com o promotor, o avanço tecnológico pode ser positivo, pois facilita a vida do professor, da escola e do aluno.

“Se a tecnologia ocupou o espaço do professor com a informação, o professor precisa ocupar o espaço vazio das emoções”, ressalta. Segundo ele, é papel do educador ouvir e compreender o aluno, algo que a tecnologia não provém.

Ressalta que o aluno com problemas na família ou na sociedade precisa da escola como uma referência pacificadora. “Temos atuado dessa forma na resolução de conflitos com resultados positivos.”

[bloco 5]

Para a coordenadora da 3ª CRE, a neurociência precisa entrar na formação do professor, e escola do futuro é aquela que aliará técnica com o amor. “É essa pedagogia que já está começando, e que precisa acontecer mais para que professor e alunos consigam construir uma aula.”

Segundo ele, hoje estamos no século XXI, com professores do século XIX e uma estrutura do século XVIII.

Para Ieda Giongo, a educação precisa preparar os alunos para a vida, e a vida hoje é digital. Segundo ela, é preciso estabelecer a melhor forma de usar essas tecnologias, por meio de pesquisas. “Não podemos simplesmente ir para a sala de aula e começar a usar o celular por meio do achismo.”

Wiethölter lembra que o computador está na mesa de trabalho de todos. Para ele, se isso não estiver nas salas de aulas, mais uma vez a educação ficará pra trás em relação à sociedade. “O professor na nossa escola faz a chamada on-line e não temos mais problema com fechamento de notas pois está tudo digitalizado”.

Ao final do evento, os debatedores foram unânimes em apontar a necessidade de manter uma discussão permanente sobre o tema. A proposta é de reunir mais profissionais da área em um fórum de debates contínuo.

Thiago Maurique: thiagomaurique@jornalahora.inf.br

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