Enchente desabriga pelo menos 90 famílias

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Enchente desabriga pelo menos 90 famílias

O Rio Taquari subiu em média oito metros desde ontem, causando série de inundações em diferentes cidades e bairros da região. Pelo menos 90 famílias tiveram de ser retiradas de suas casas para abrigos improvisados pelos governos municipais e equipes da Defesa Civil.

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Gustavo Adolfo 1 - Lateral vertical - Final vertical

Crédito: Rodrigo Martini

Vale do Taquari – A anunciada enchente foi confirmada nas primeiras horas da manhã de ontem. Com um dos maiores volumes de chuva registrados nos últimos anos em julho, algumas áreas ficaram alagadas durante toda a terça-feira, forçando a remoção de famílias para locais seguros. Desde domingo, foram 170 milímetros de chuva, medida prevista para todo o mês.

Os pontos de alagamento foram os mesmos registrados em enchentes passadas. Em Lajeado, eles se concentraram na av. Décio Martins Costa e nas ruas Francisco Oscar Karnal, Carlos Sphor Filho, Leopoldo Heineck e Santos Filho, no centro; além da Pedro Petry, no Universitário; e a rua Arnoldo Uhry, entre os bairros Moinhos e Jardim do Cedro.

Até as 21h de ontem, 12 famílias tiveram de deixar as casas. Sete delas foram para familiares ou amigos, e as outras cinco desalojadas estavam abrigadas no pavilhão 3 do Parque do Imigrante.

Entre os flagelados do parque, estava o pedreiro, Airton Antônio Kollet. Morador do “Cantão do Sapo” faz 25 anos, ele afirma ter enfrentado mais de 50 enchentes em toda a vida. “Em uma ano já enfrentamos três cheias. Uma depois da outra”, relembra. Ontem, a água chegou à porta de sua casa por volta das 10h. “Agora deve estar inundada”, lamenta.

Kollet conseguiu, com ajuda da esposa e do filho, levar duas geladeiras – uma queimada – uma cama de casal, um fogão, um micro-ondas e algumas roupas para o abrigo. O resto ficou na casa. “Deixei móveis e até uma cama. Estavam deteriorados da última enchente. Se mexesse, eles iriam desmanchar.”

Apesar do visível incômodo, ele não pretende deixar a pequena casa localizada próxima ao campo do Parque dos Dick, na rua Francisco Oscar Karnal. “Estou perto do centro. A prefeitura quer tirar os pobres dali e mandar para o fim do mundo. Daí teremos que pegar ônibus e tudo mais. Fica mais difícil”, comenta.

O vizinho Leonir Monteiro concorda com a manutenção das casas na área alagável. “Se me oferecessem um terreno próprio eu iria, independente do bairro. Mas querem botar naqueles prédios populares. Imagina como aquilo estará daqui cinco anos?”, questiona, referindo-se à construção dos loteamentos Novo Tempo I e Novo Tempo II.

Ambos elogiam a atuação da equipe da Defesa Civil, mas criticam a administração municipal. Segundo Kollet, a mudança dos móveis foi feita pelos próprios flagelados. “Em anos anteriores houve ajuda. Dessa vez fizemos por nós.” Os amigos pretendem voltar para casa ainda nesta semana. “Assistimos tornados em outras cidades. Aqui a água sobe devagar. Então estamos bem.”

Moradores aguardam

A esquina da rua João Pessoa com a av. Décio Martins Costa é um dos primeiros pontos a alagar em Lajeado. Não foi diferente desta vez. Calejados dessas situações, moradores iniciaram a remoção de alguns móveis já na noite de segunda-feira. As notícias acompanhadas pelo rádio na manhã de ontem aceleraram as medidas de proteção.

Nelson Ivanor de Souza mora faz 51 anos em uma casa de madeira localizada nos fundos de uma revenda de veículos. “Comecei a recolher minhas coisas e levar para casas de vizinhos. Agora estamos aguardando instruções da Defesa Civil. Em princípio não precisaremos sair de casa”, salienta. Com um rádio a pilha, ele seguia atento ao movimento do rio Taquari na cabeceira de Encantado.

Vizinha de Souza, Grazilena Schmitz, mora há dois meses em uma casa de alvenaria. A residência alugada por R$ 550 mensais apresenta bastante avarias causadas pelas recorrentes enchentes. Rachaduras na parte inferior do imóvel preocupam os moradores. “Queríamos levar todos os móveis para o andar de cima, mas tenho medo que despenque tudo”, comenta.

Assim como seu vizinho, ela aguarda determinações da equipe da Defesa Civil. Todas as roupas e pertences dos filhos já estavam embalados em cobertores. Assim como outros moradores da rua, ela e o marido não foram trabalhar durante a terça-feira para garantir a segurança dos bens materiais e do próprio lar.

Acesso fechado em Colinas

Desde o início da manhã de ontem o acesso à Colinas pela ERS-129 estava prejudicado. A poucos metros da área urbana, o Rio Taquari deixou o asfalto submerso em um trecho de quase 300 metros de rodovia. Motoristas desavisados precisaram utilizar um acesso secundário de estrada de chão, percorrendo em média três ou quatro quilômetros a mais para chegar ao centro da cidade.

Quem tentava deixar o município também precisou recorrer ao atalho coberto de lama. Eduardo Altmann, morador de Colinas, foi um deles. Por volta de 13h, ele saiu para levar o filho, Carlos Eduardo, ao colégio. Antes de pegar a estrada secundária, levou o adolescente para ver o estrago causado pela água na entrada da cidade. “Ele pediu para ver. Para eles é diferente”, comenta.

Já o morador de Westfália, Luis Bonadimam, estava indo pela ERS-129 até Colinas para entregar uma carga de ração. “Ninguém me avisou. Eles só mandam eu ir. Sorte que não tenho horário.” Ele não sabia como acessar a cidade por outro acesso. “Vou ligar para um amigo me informar.” Antes do local onde ele estacionou o caminhão, haviam placas indicando desvios.

Gerador ameniza perdas

Na Linha 31 de Outubro, interior de Colinas, os agricultores ficaram sem abastecimento de energia elétrica desde segunda-feira. Na propriedade de Alessandro Mânica, produtor de ovos férteis, há sete meses foi instalado um gerador de 45 KVA, cujo investimento chegou a R$ 55 mil. O aparelho evita a queda na produção e a mortandade de galinhas. “As quedas são recorrentes e sem energia o prejuízo é certo.”

Em novembro, a queima de um gerador de energia provocou a morte de seis mil galinhas poedeiras devido ao calor e a falta de água nos bebedouros. Há quatro anos, para garantir o abastecimento integral da rede trifásica necessária para movimentar as máquinas de recolhimento de ovos, distribuição de água, ração e ventiladores nos aviários onde estão alojadas 30 mil aves, ele fez uma parceria com a AES SUL.

Juntos, aplicaram R$ 25 mil na construção de uma linha de transmissão exclusiva para a propriedade e a instalação de um gerador mais potente. Mesmo assim, as quedas persistem. “Cada dia sem abastecimento gera uma perda financeira de R$ 300.”

Mânica destaca que a galinha, na ausência da energia elétrica, registra perda no potencial produtivo. Em seu ciclo de 10 meses, ela produz em média 185 ovos. “As quedas resultam em produção até 10% menor.” Por dia são produzidos 24 mil ovos.

Famílias ilhadas na São José

Em Estrela, na localidade São José, a água deixou oito famílias ilhadas. A ponte e a estrada que liga a comunidade estão submersas desde segunda-feira. Agricultores tem dificuldade em escoar as produções.

Conforme Ovídio Lohmann, o avanço da água do arroio Boa Vista causa transtornos aos moradores há 30 anos. “Em época de campanha, vem deputado fazer galinhada com a gente. Prometem que vão resolver o problema, mas fica sempre no mesmo. A gente esperando.”

De acordo com ele para as pessoas conseguirem sair de casa, precisam atravessar lavouras, caminhar por cerca de dois quilômetros, até a comunidade vizinha.

Em Estrela, duas famílias do bairro Imigrantes foram alojadas no ginásio do Colégio Martin Luther. Uma outra família ribeirinha acabou indo para casa de parentes. No total, sete vias do município ficaram interrompidas parcialmente: Olinda Mallmann, Matias Petter Sobrinho, Princesa Isabel, José Albino Horn, Albino Francisco Horn, estrada municipal de Linha Geralda e estrada municipal Jacob Müller.

Estradas danificadas

A chuva torrencial danificou diversas vias municipais e estradas federais e estaduais da região. Em Lajeado, foram verificados danos principalmente na Av. Benjamin Constant, nas ruas Carlos Sphor Filho, Bento Rosa, e na ERS-453, na divisa com Cruzeiro do Sul. Buracos e acúmulo de água colocaram em perigo os motoristas.

Também houve problemas na cidade de Progresso. Estradas rurais e pontes foram danificadas. Houve deslizamento de terras. São mais de mil quilômetros de vias públicas atingidas por sérios estragos com as enxurradas. O prefeito, Edegar Cerbaro, diz que, assim que for possível, serão iniciados os trabalhos de recuperação.

“Agrava-se mais ainda o problema, por ocorrer em um momento de forte crise econômica.” De acordo com informações da Emater-RS/Ascar, também foram atingidas as pastagens nas propriedades dos produtores de leite, provocando a diminuição da produtividade diária.

Na cidade de Cruzeiro do Sul, equipes da prefeitura e da Defesa Civil analisam os estragos causados pelas cheias. A parte baixa do bairro vila Zwirtes foi a mais monitorada. No entanto, houve interrupções mesmo nas vias de acesso as localidade de Sampaio, Boa Esperança Alta e Baixa e em direção a Linha Nova.

Em Arroio do Meio, pelo menos uma família precisou deixar a casa localizada na área central, nas proximidades do bairro Navegantes. Os moradores foram abrigados por familiares. Três ruas foram parcialmente inundas. A Alagoas, no bairro Aimoré, e as vias São José e Dom Pedro II, ambas no centro. Já em Linha 32 houve registro de morte de duas vacas atingidas por um raio.

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